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Entrevista de Ezra Pound a P.P. Pasolini

(1967)

Assista ao vídeo logo abaixo do texto

 

Pier Paolo Pasolini: Quando você chegou na Itália, ela era ainda pré-industrial, agrícola e artesanal. Agora, tornou-se uma nação bastante industrializada e produz uma literatura semelhante àquelas produzidas nos Estados Unidos e na Inglaterra, nesses últimos anos. Agora, a Itália é parte das nações industrializadas e culturalmente avançadas e então aflora um novo tipo de literatura que é típico das nações burguesas, industrializadas. Os movimentos de vanguarda se tornaram frequentes na Itália. Você reconhece a paternidade desses movimentos de agora na Itália ou não?
Ezra Pound: Você fala e “então nações culturalmente avançadas e industrializadas”. Eu não concordo com esse “então”: eu não gosto disso. É difícil responder à sua questão, porque os movimentos de vanguarda não se desenvolveram na Itália industrializada de agora. Esse fenômeno, de produtos vanguardistas, ocorre no mundo todo. E é impossível para mim manter-me informado e a par de todos. Eu diria que eu sou “raso” neste novo tema.

Pasolini: Seu nome é invocado pela nova vanguarda italiana. Você gosta ou não gosta disso?
Pound: Se é correta a tese de que o velho Ezra está no círculo escuro de seu passado muito mastigado, não me parece verossímil, mas talvez você esteja certo. Entretanto, eu não estou em uma posição que me permite ver com clareza o que acontece além da luz de neon das novas vanguardas em cotejo com as primeiras vanguardas do século XX. Eu espero que entendam e me perdoem, mas não consigo alcançá-las.

Pasolini: Quais são os artistas que você mais admira?
Pound: Eu admiro os artistas do Século XIV.

Pasolini: Você admira algum pintor seu contemporâneo? Aqueles que trabalharam de 1917 a 1930, em sua juventude?
Pound: Fernand Léger.

Pasolini: Você admira mais os pintores cuja obra se aproxima de sua poesia ou de pintores que estejam longe de sua poética?
Pound: Eu escrevi, um dia, nas margens de uma carta para alguém: “o pintor Wyndham Lewis”. Eu me interesso muito pouco por pintura. Um crítico, uma vez escreveu algo correto sobre mim. Ele diz que eu escolhi a escultura e a música para compará-las com a poesia e que eu nunca mostrei interesse pela pintura.

Pasolini: O Segundo Canto, de seus Cantos Pisanos, começa assim: “Out of Phlegethon/out of Phlegethon/ Gerrhart/ art thou come forth out of Phlegethon?/ with Buxtehude and Klages in your satchel, with the Standebuch of Sachs in your luggage/ – not of one bird but of many see” [Nota do tradutor: “Phlegethon” é o rio de sangue fervente que é  mencionado na primeira parte, do Sétimo Círculo do inferno de Dante Alighieri. Ludwig Klages é um filosofo nascido em Hannover; tornou-se conhecido por seus estudos sobre a expressão. Dieterich Buxtehude foi um compositor e organista teuto-dinamarquês do período barroco]. E aqui você encerra abruptamente o aspecto verbal do poema e lança em seguida uma partitura musical. A partitura é muito extensa. A que música você se refere?
Pound: Refiro-me à “Canção do Pássaro” de Clément Janequin, escrita para coro, Francesco da Milano transcrita para alaúde e Gerrhart retranscrito para violino.

Pasolini: Quero ler um trecho que, creio, você fala de sua vida, que está nos Cantos Pisanos, momento muito doloroso de sua vida: “The young Dumas weeps because the young Dumas has tears”.  O jovem Dumas é você?
Pound: Não. Com “young Dumas” eu não pensei em mim mesmo. Entretanto, eu escrevi os Cantos Pisanos com muita tristeza. A tristeza chegou tarde em minha vida.

Agora, Pasolini lê, findando o encontro, este trecho dos Cantos Pisanos:

Dal Canto LXXXI 

(Strappa da te la vanità…)

Quello che veramente ami rimane, il resto è scorie
Quello che veramente ami non ti sarà strappato
Quello che veramente ami è la tua vera eredità
Il mondo a chi appartiene, a me, a loro, o a nessuno?
Prima venne il visibile, quindi il palpabile Elisio, sebbene fosse nelle dimore d’inferno,
Quello che veramente ami è la tua vera eredità

La formica è un centauro nel suo mondo di draghi.
Strappa da te la vanità, non fu l’uomo
A creare il coraggio, o l’ordine, o la grazia, Strappa da te la vanità, ti dico strappala
Impara dal mondo verde quale sia il tuo luogo
Nella misura dell’invenzione, o nella vera abilità dell’artefice.
Strappa da te la vanità, Paquin strappala!
Il casco verde ha vinto la tua eleganza.

«Dòminati, e gli altri ti sopporteranno» Strappa da te la vanità
Sei un cane bastonato sotto la grandine,
Una pica rigonfia in uno spasimo di sole,
Metà nero metà bianco
Né distingui un’ala da una coda
Strappa da te la vanità Come son meschini i tuoi rancori
Nutriti di falsità. Strappa da te la vanità,
Avido di distruggere, avaro di carità,
Strappa da te la vanità, Ti dico, strappala.

Ma avere fatto in luogo di non avere fatto questa non è vanità

Avere, con discrezione, bussato
Perché un Blunt aprisse Aver raccolto dal vento una tradizione viva
o da un bell’occhio antico la fiamma inviolata
Questa non è vanità. Qui l’errore è in ciò che non si è fatto,
nella diffidenza che fece esitare.

(Traduzione di Alfredo Rizzardi)

*

(Pull down thy vanity…)

What thou lovest well remains, the rest is dross
What thou lov’st well shall not be reft from thee
What thou lov’st well is thy true heritage
Whose world, or mine or theirs or is of none?

First came the seen, then thus the palpable Elysium, though it were in the halls of hell,
What thou lovest well is thy true heritage

The ant’s a centaur in his dragon world.
Pull down thy vanity, it is not man
Made courage, or made order, or made grace, Pull down thy vanity, I say pull down.
Learn of the green world what can be thy place
In scaled invention or true artistry,
Pull down thy vanity, Paquin pull down!
The green casque has outdone your elegance.

«Master thyself, then others shall thee beare» Pull down thy vanity
Thou art a beaten dog beneath the hail
A swollen magpie in a fitful sun,
Half black half white
Nor knowst’ou wing from tail
Pull down thy vanity How mean thy hates
Fostered in falsity, Pull down thy vanity,
Rathe to destroy, niggard in charity,
Pull down thy vanity, I say pull down.

But to have done instead of not doing this is not vanity

To have, with decency, knocked
That a Blunt should open To have gathered from the air a live tradition
or from a fine old eye the unconquered flame
This is not vanity. Here error is all in the not done,
all in the diffidence that faltered.

 

Transcrição da entrevista: Régis Bonvicino