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A pluralidade da língua portuguesa

Entrevista de Régis Bonvicino a Valdemar Cruz para o jornal Expresso, de Lisboa

Expresso: Qualquer alteração no Acordo tem de merecer a aprovação dos países envolvidos. Neste momento, no Brasil, está em aberto ou é equacionada qualquer mudança, ou o Acordo é já um dado adquirido sobre o qual não existe grande discussão?

Régis Bonvicino: O acordo foi imposto aos brasileiros pelas grandes editoras comercais. Ele já está adotado na prática há anos pelos grandes jornais, Folha, O Globo e outros. Os grandes portais de internet o adotaram também. Não houve reflexão e ou discussão no Brasil. O Acordo foi imposto de cima para baixo, inclusive pelo governo Lula. Há diferença notável entre o português europeu e o português brasileiro: este último recebe, hoje, acriticamente, dezenas de anglicismos por dia, que se tornam então brasileirismos, usados no dia a dia. Há um lado saudável nisso; entretanto, eu prefiro cuidar da língua como língua de cultura, com limites mínimos ao menos; talvez eu não fosse tão drástico como os portugueses o são, mas não permitiria nomes próprios esquisitos como Maicon, embora engraçado e afetivo (tradução sonora e popular de Michael Jackson). Prefiro “défice” a “déficit” (usado no Brasil).

E: Que opinião tem sobre este novo Acordo Ortográfico?

RB: Ele representa um empobrecimento da língua, porque a língua é a língua e suas muitas variantes, mas é preciso, nesses tempos de competição econômica acirrada, que haja uma língua portuguesa única, para que ela possa ter inclusive valor econômico.

E: Um dos problemas tem sido a elaboração do Vocabulário Ortográfico Comum. Brasil e Portugal têm os seus. Os restantes países estão atrasados no processo. Esse pode ser um obstáculo à efetiva entrada em vigor do Acordo na totalidade dos países da CPLP? E não entrando em vigor em todos, perde a sua esperada eficácia?

RB: Moçambique quer fazer um plebiscito visando a adotar o inglês como língua oficial (risos). Retorno ao clichê: minha língua (rica, com variantes) é minha pátria. Sou a favor de políticas de valorização e difusão de todos os portugueses existentes. Sou a favor da pluralidade do português, além de minhas próprias posições pessoais.

E: Pelo menos em Portugal, o Acordo tem sido discutido com muita emoção, misturando sentimentos de ordem política e nacionalista, muitas vezes sem cuidar da componente científica ou da utilidade ou inutilidade do AO. No Brasil passou-se ou passa-se algo de similar?

RB: Não, como lhe disse, não houve qualquer discussão no Brasil inteiro, talvez tenha havido discussão pontual aqui e acolá. Os usuários da língua escrita (grandes empresas de comunicação e editoras comerciais e didáticas) o adotaram e pronto. Entendo a reflexão dos portugueses acerca do “Acordo” como imprescindível. Todavia, ao que me parece, a discussão portuguesa tornar-se-á mero sebastianismo linguístico. Mas, eu, como poeta, adoto sempre também causas perdidas. (Em 14 de março de 2012.)

1º. Mandarim – 1051 milhões – China, Malásia e Taiwan;
2º. Hindi – 565 milhões – Índia, regiões norte e central;
3º. Inglês – 545 milhões – EUA, Reino Unido, Partes da Oceania;
4º. Espanhol – 450 milhões – Espanha e Américas;
5º. Árabe – 246 milhões – Oriente Médio, Arábia, África do Norte;
6º. Português – 218 milhões – Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde;
7º. Bengalês – 171 milhões – Bangladesh, Nordeste da Índia;
8º. Russo – 145 milhões – Rússia e Ásia Central;
9º. Francês – 130 milhões – França, Canadá, Oeste e Centro da África e
10º. Japonês – 127 milhões – Japão.

Português é o idioma da nova economia

Lia Coelho

A língua portuguesa como instrumento cultural perdeu terreno e agora tem um valor – cada vez mais – econômico, quem o diz é o professor Choi Wai Hao, em mais uma palestra no âmbito do Festlatino. Algo fácil de entender, em tempos de aposta nos mercados dos países falantes de português. “O português tornou-se importante economicamente, antigamente não havia essa necessidade, agora a China quer sair para mercados como Brasil ou Angola e precisa formar pessoas”, explica o professor ao Hoje Macau. A procura centra-se mais em tradutores e intérpretes de português – e tem aberto as portas do mundo do trabalho da lusofonia para quem aprendeu o idioma de Camões.

Wai Hao falou das vantagens culturais e linguísticas da RAEM como um centro de ensino e investigação do português na China. “A língua portuguesa funcionou e continua a funcionar em Macau, mesmo depois de 1999, e isso traz vantagens”, comenta. Uma comunidade macaense, uma portuguesa, imprensa, rádio e televisão formam um conjunto de fatores que propiciam a aprendizagem do idioma, nas palavras do orador. Mais uma afirmação do território como plataforma de cooperação e facilidade do ensino da língua.

O crescente interesse é já visível também na China, onde, desde 2003 – ano de criação do Fórum Macau –, o número de universidades com licenciatura em Português aumentou de três – uma em Xangai e duas em Pequim – para dezesseis. “Não contando com aquelas que têm cursos opcionais.” Apesar deste crescimento, na opinião do professor é necessário haver maior aposta e maior investimento para a formação de pessoas.

PORTUGUESE LANGUAGE

Olavo Bilac
Translated into English by Odile Cisneros

Latium’s last flower, lovely and wild,
You are at once splendor and tomb:
Native gold, the ore subsumes,
Coarse mine in gravel, undefiled…

I love you so, unknown, obscure,
Loud-clanging trumpet, simple lyre.
You have the hiss of tempests and the fire,
Tender saudade, lullaby’s allure!

I love your rural rankness and your scent
Of virgin forests and of boundless seas!
I love you, oh rough language of lament,

In which I heard a mother’s voice call “My son!”,
In which Camões in bitter exile wept
His ill-starred genius and lackluster love!

LÍNGUA PORTUGUESA

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

em que da voz materna ouvi: “meu filho!”,
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

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 Sobre Régis Bonvicino

Poeta, autor, entre outros de Até agora (Imprensa Oficial do Estado de S. Paulo), e diretor da revista Sibila.