11 de abril de 2013
A Anistia Internacional volta a apontar a China como o país responsável pela maioria das execuções de prisioneiros ocorridas em todo o mundo. Não há dados concretos, mas os números da aplicação da pena de morte estão estimados em “milhares”. A revisão do Código de Processo Penal e planos para maior publicidade dos julgamentos permitem, no entanto, assinalar melhorias.
A China mantém-se o país mais obscuro do mundo quanto à aplicação da pena de morte, sendo também tido como líder nas execuções realizadas em 2012, de acordo com o último relatório da Anistia Internacional (AI) sobre a situação da pena de morte a nível global.
A organização internacional deixou em 2009 de proceder ao levantamento de dados sobre as execuções e sentenças de morte no Continente, onde a matéria está legislada como segredo de Estado. Ainda assim, pressupõe, o registro de execuções na China em 2012 será “maior do que no conjunto do resto do mundo”.
No total, a AI contabiliza um total de 682 execuções no ano passado, ocorridas em 21 países. “O número de execuções confirmadas foi 682, essencialmente o mesmo que em 2011, com 680, também em 21 países. A cifra de 682 exclui os milhares de execuções ocorridas na China, responsável por mais execuções do que o resto do mundo no seu conjunto. Três quartos das execuções confirmadas foram registradas em apenas três países: Irã, Iraque e Arábia Saudita”, resume o relatório.
Apesar de os números não evidenciarem grande variação, a AI entende que estes “confirmam que a tendência global é de abolição”. A organização destaca que “apenas um em cada dez países do mundo procedeu a execuções” durante 2012, mas admite também recuos na Ásia, África e região árabe. “O retomar das execuções, em especial, na Gâmbia, na Índia, no Japão e no Paquistão, bem como a subida alarmante de execuções reportadas no Iraque por comparação com 2011 constituem uma preocupação grave”, sublinha o documento.
Redução sem provas
Sem dados disponíveis, a Anistia estima que a China tenha levado a cabo milhares de execuções no ano passado, adotando os métodos de injeção letal e fuzilamento, e mantendo os crimes econômicos como motivo para condenação com a pena capital – contrariamente ao estipulado no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP), que admite a sentença de morte “para os crimes mais sérios” de acordo com as leis em vigor nos países signatários, embora apelando à sua abolição. O tratado internacional foi assinado pela China, ainda que não tenha sido até aqui ratificado.
“A China continua a representar a maioria das execuções do mundo, mas a falta de transparência em torno da aplicação da pena de morte no país fez com que, mais uma vez, seja impossível confirmar os dados que traduziriam adequadamente a realidade da pena capital no país”, manifesta a AI.
Para a compilação do relatório, a organização depende de dados oficiais, de relatos na imprensa e daqueles que são produzidos pelos indivíduos condenados ou pelos representantes legais e familiares destes. “Os media detidos pelo Estado continuaram a acompanhar casos de alto relevo, como o da empresária Wu Ying, que foi condenada à morte por ‘angariação de fundos fraudulenta’, mas não forneceram a informação necessária para promover um debate significativo sobre a pena capital no país”, nota o relatório na seção dedicada à China.
A Anistia Internacional diz que permanecem por provar as alegações feitas por dirigentes do Supremo Tribunal Popular de que o número total de execuções diminuiu para menos de metade desde que o tribunal começou, em 2007, a ter a atribuição de rever todas as sentenças de morte proferidas em instâncias inferiores.
“As condenações à pena de morte continuaram a ser ditadas após julgamentos injustos e por ofensas como tráfico de droga e crimes financeiros, não indo ao encontro da fasquia de ‘crimes mais sérios’, como estipula o artigo 6º do PIDCP. Não foram criados na legislação nacional quaisquer procedimentos que permitam aos prisioneiros no corredor da morte procurar a anistia ou a comutação da pena”, descreve a organização.
O relatório destaca apenas dois casos de execuções ocorridos no país no ano passado, ambos relacionados com tráfico de drogas e envolvendo indivíduos não residentes no Continente: Robert Shan Shiao-may, de Hong Kong, e Lien Sung-ching, de Taiwan. Os dois homens, condenados em 26 de Junho de 2009 e acusados do tráfico de 192 quilogramas de metanfetaminas para as Filipinas, foram executados no dia 30 de março de 2012, sem qualquer informação à família.
Defesa sem dúvidas
A Anistia Internacional destaca, não obstante as fortes críticas a Pequim, o Plano de Ação Nacional de Direitos Humanos aprovado pelo Conselho de Estado para o período entre 2012 e 2015. Este plano prevê que passe a haver audiência pública em julgamento de recursos, que haja um exame da argumentação da defesa e que os acórdãos mais importantes do Supremo Tribunal Popular tenham em vista a clarificação de normas relativas à aplicação da pena de morte no país.
A revisão do Código de Processo Penal, que entrou em vigor no início deste ano, é outro dos progressos registrados pela AI, ao permitir que todas as sentenças de morte possam ser analisadas em última instância e ao tornar obrigatória a gravação de interrogatórios de suspeitos que possam vir a enfrentar a pena de morte ou prisão perpétua.
“É exigido aos tribunais, Ministério Público e polícia que notifiquem os gabinetes de apoio judiciário para que providenciem advogado de defesa a todos os suspeitos e arguidos que possam enfrentar pena de morte ou prisão perpétua e que ainda não tenham defesa legal. No entanto, não há qualquer consequente responsabilidade de as organizações que prestam apoio judiciário responderem à notificação, nem um prazo que cumpram a nova legislação”, contrapõe a Anistia.
A organização lembra que acadêmicos do Continente têm pedido “uma maior clarificação que estabeleça na lei sem margem para dúvidas que o apoio judiciário à defesa está disponível em todas as fases do processo em casos de pena de morte”. “Pediram também que haja uma definição mais clara do papel e responsabilidade dos advogados de defesa em sede de recurso e na revisão final do caso”, acrescenta o documento.
Noutro desenvolvimento político assinalado, de novembro passado, as autoridades anunciaram ainda que seria lançado a nível nacional um sistema de doação voluntária de órgãos, de forma a reduzir a dependência de órgãos obtidos dos cadáveres de prisioneiros executados.