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SIBILA DEBATE 64: Marcelo Ridenti

Marcelo Siqueira Ridenti é professor titular do Departamento de Sociologia da UNICAMP. Foi professor na Universidade Estadual de Londrina (1983-1990), na Universidade Estadual Paulista, Araraquara (1990-1998). Graduou-se em Ciências Sociais (1982) e em Direito (1983) na Universidade de São Paulo, onde concluiu o doutorado em Sociologia (1989). Defendeu tese de livre docência em Sociologia na Unicamp (1999). Autor dos livros Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV (Record, 2000), O fantasma da revolução brasileira (Editora Unesp, 1993), Classes sociais e representação (Cortez, 1994), Professores e ativistas da esfera pública (Cortez, 1995), Política pra quê? Atuação partidária no Brasil contemporâneo (Atual, 1992). Organizador de História do Marxismo no Brasil, vol. 5 – Partidos e organizações dos anos 20 aos anos 60 (Editora Unicamp, 2002, em parceria com Daniel Aarão Reis); Intelectuais: sociedade e política – Brasil-França (Cortez, 2003, em parceria com Elide Rugai Bastos e Denis Rolland; obra publicada também na França, ed. L’Harmattan, 2003); O golpe e a ditadura militar, 40 anos depois, 1964-2004 (ed. Edusc, 2004, em pareceria com Daniel Aarão Reis e Rodrigo Patto Sá Motta). Desenvolve pesquisas sobre intelectuais e artistas, bem como sobre partidos e movimentos de esquerda.

Sibila: Jacob Gorender enfatiza, segundo o historiador Carlos Fico, que, no pré-64, engendrou-se uma real “ameaça à classe dominante brasileira e ao imperialismo”: “O período 1960-1964 marca o ponto mais alto das lutas dos trabalhadores brasileiros neste século [XX]. O auge da luta de classes, em que se pôs em xeque a estabilidade institucional da ordem burguesa sob os aspectos do direito de propriedade e da força coercitiva do Estado. Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma situação pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contrarrevolucionário preventivo”. Segundo Carlos Fico, “Gorender consolidou, em traços gerais, duas das principais linhas de força interpretativas sobre as razões do golpe: o papel determinante do estágio em que se encontrava o capitalismo brasileiro e o caráter preventivo da ação, tendo em vista reais ameaças revolucionárias provindas da esquerda”. O senhor concorda com essa visão do golpe? Ela não tem algo de irrealista? Havia, de fato, ameaças reais ao poder e ao statu quo vindas da esquerda? A conjuntura externa e as grandes tensões da Guerra Fria não foram uma lente que deformou as percepções políticas da época? Paradoxalmente, este não é o argumento central dos que justificam o golpe?

Ridenti: Golpistas como o ex-coronel Jarbas Passarinho elogiaram o livro Combate nas trevas, de Gorender,1 por concordar com a ideia do contragolpe preventivo. Só que eles detectavam um perigo comunista que de fato não havia; o que estava em jogo – creio que essa era a ideia de Gorender – seria a possibilidade de uma revolução nacional e democrática que alargaria os direitos dos trabalhadores do campo e da cidade, politizando-os e diminuindo as desigualdades sociais, algo que os conservadores consideravam comunismo. No contexto da Guerra Fria – e numa formação social como a brasileira, excludente e autoritária, com os privilegiados tradicionalmente temerosos dos movimentos populares – as ditas reformas de base pareciam ameaçadoras. Pensando do ponto de vista das classes dominantes, o golpe foi acertado; por que deveriam arriscar perder alguns de seus privilégios se podiam sufocar o movimento que viam como ameaçador? O chamado “pacto populista” – que unia o Estado desenvolvimentista, trabalhadores urbanos e setores do empresariado – ruiu com a crescente politização no começo dos anos 1960, inclusive dos trabalhadores rurais, que constituíam ainda a maioria da sociedade e estavam fora do pacto, a exigir direitos que as elites não estavam dispostas a conceder. Foi criada uma situação que não interessava aos que queriam paz para conduzir seus negócios, o que não quer dizer que o processo levaria ao comunismo.

 

O presidente João Goulart e o embaixador americano, Lincoln Gordon.
O presidente João Goulart e o embaixador americano, Lincoln Gordon.

 

Sibila: Gorender escreveu: “O núcleo burguês industrializante em 1964 e os setores vinculados ao capital estrangeiro perceberam os riscos dessas virtualidades das reformas de base e formularam a alternativa da ‘modernização conservadora’”. A “modernização conservadora” não foi uma criação do governo militar, mas é uma marca da história brasileira, incluindo a Proclamação da República pelo exército, a República Velha, o governo Vargas, o governo JK. Hoje, o Brasil de 2014 tem um perfil agrário e exportador, sem uma burguesia industrial fortalecida. Ao mesmo tempo, desde os governos FHC e Lula e incluindo o governo Dilma, há uma proclamada ascensão econômica das classes mais baixas, mas restrita ao consumo, e excluindo todos os fatores da cidadania moderna, a começar da educação. Esta seria uma das caras reatualizadas da modernização conservadora à brasileira em geral, e de 1964 em particular?

Ridenti: A modernização conservadora, que outros chamariam de via prussiana ou revolução passiva, é um traço da formação social brasileira que vem de longe. Talvez o que estivesse em jogo no pré-1964 fosse justamente romper com esse processo, criar uma alternativa de modernização que ampliasse os direitos dos de baixo e diminuísse as desigualdades sociais. Abriam-se disputas que criavam incertezas sobretudo nas classes dirigentes. Algo que permanece até hoje, tanto que os governos após o final da ditadura não romperam com a lógica de concentração de riquezas e reprodução das desigualdades sociais, apesar de ações pontuais, temerosos de não conseguir assegurar a “governabilidade”.

Mas não caberia imaginar que a modernização conservadora do período ditatorial foi apenas continuação do que havia antes. Implicou rearranjos institucionais e econômicos que permitiram o salto conhecido como “milagre brasileiro”, bem como um reordenamento da sociedade.

A atual organização da ordem produtiva, do Poder Judiciário, do sistema partidário, da Previdência e dos mecanismos de assistência social, da indústria cultural, do complexo de telecomunicações, das polícias, dos bancos e finanças, do sistema de ensino, inclusive nas universidades e na pós-graduação, tudo isso tem raízes naquele período decisivo da modernização conservadora da sociedade brasileira. Ela não pode ser atribuída só aos militares, mas também a seus aliados civis, que levaram em conta a ação das oposições, cujas demandas procuraram contemplar a seu modo, quer com medidas impostas, quer negociadas, o que significa que elas também participaram desse processo. Isso leva a um outro aspecto do livro mencionado de Gorender, que apresenta uma ideia polêmica que tem sido menos lembrada: o regime militar reorganizou em novos termos a hegemonia burguesa, que não mais poderia se manter com base na ideologia populista.

Com idas e vindas, o regime militar estabeleceu uma arquitetura política que envolvia não só a força, mas também o convencimento. Com um braço reprimia, com o outro dava lugar dentro da nova ordem aos diferentes indivíduos, grupos e classes sociais, até mesmo de oposição, buscando mecanismos de aceitação pacífica da ordem econômica, social e política estabelecida. Os exemplos são vários: nos meios intelectuais, junto com as cassações vieram as bolsas de estudo, a ampliação do sistema universitário, bons empregos no setor público e privado; nos meios artísticos, em paralelo à censura, desenvolveu-se uma indústria cultural com resultados notáveis, por exemplo na televisão, na propaganda, nos discos, além do apoio oficial ao teatro e ao cinema, mesmo que muitos dos envolvidos no trabalho cultural e intelectual se considerassem de oposição. Não era raro um artista ser financiado por uma agência do Estado e depois ver o resultado de seu trabalho proibido pela censura.

A situação era complexa também nas bases da sociedade. Dados do IBGE organizados por Armando Boito indicam que, nos piores anos da repressão, entre 1968 e 1978, o total de sindicatos oficiais na área urbana saltou 53,3%, foi de 2.616 para 4.009.2 Nas regiões rurais houve crescimento ainda mais expressivo, ligado à iniciativa da ditadura militar, que atrelava os sindicatos ao sistema previdenciário e a convênios assistenciais: de 625 sindicatos em 1968, o total chegou a 1.669 em 1975. O regime criou ainda o Funrural, aposentadoria no campo, enfim, mecanismos para integrar à ordem os setores despossuídos, ainda que sem alterar as estruturas sociais.

 

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Sibila: Alguns consideram que sem a guerrilha de 1969 a 1975 (pós AI-5), incluindo a do Araguaia, não haveria redemocratização formal do país. Sem as torturas e outros fatores (governo Jimmy Carter) a presença dos militares se prolongaria no tempo. O senhor concorda com esta tese? Ela não simplifica tudo em uma variável, talvez hipertrofiada e inteiramente externa ao regime, omitindo, por exemplo, os conhecidos embates dentro da cúpula militar, justamente quanto à questão da necessidade da redemocratização? Há algum documento estratégico do governo militar que contemple a perspectiva de uma ditadura indefinida?

Ridenti: Sem hesitar em usar a força, os golpistas de 1964 preocuparam-se também com sua legitimidade. O golpe foi dado em nome da democracia, supostamente ameaçada. O regime instaurado jamais se assumiu como ditadura, no máximo como “democracia relativa”. Sempre se preocupou em manter uma fachada democrática. O Congresso funcionou durante quase todo o período, apesar das cassações de mandatos parlamentares em momentos de crise, da imposição do bipartidarismo no final de 1965, e de ser fechado de tempos em tempos, além de outros constrangimentos. Havia julgamento legal de prisioneiros políticos, embora na Justiça Militar e sob leis duras, sem contar perseguições a oposicionistas, torturas e mortes à margem da lei do próprio regime. Os militares governaram sob a vigência de uma Constituição, mesmo com os limites daquela de 1967, reformada estruturalmente em 1969, em sentido ainda mais autoritário.

Quanto à esquerda armada, parece-me que não caberia superdimensionar sua importância. Seria difícil demonstrar que ela contribuiu diretamente para a redemocratização. Os diversos projetos revolucionários iam além do mero retorno institucional ao pré-64. Mas tampouco caberia supor que os grupos em armas tenham sido responsáveis pelo endurecimento do regime, como querem vários intérpretes e agentes políticos.

Como expus na reedição de meu livro sobre a esquerda armada,3 os defensores do regime dizem que foram levados ao uso da repressão mais dura após o AI-5 para responder à ameaça da guerrilha promovida por setores da esquerda que, por sua vez, alegam que o fechamento da ditadura levou-os a pegar em armas para combatê-la. Os dois argumentos parecem problemáticos, ainda que sirvam aos sujeitos envolvidos para justificar suas próprias ações.

O argumento de parte da esquerda não se sustenta, pois houve organizações expressivas que não pegaram em armas, não só o Partido Comunista Brasileiro (PCB), tido como reformista, mas também grupos que se consideravam revolucionários, caso da Ação Popular (AP) e do Partido Operário Revolucionário Trotskista (PORT). Ademais, em 1968, a Ação Libertadora Nacional (ALN), a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), e os Comandos de Libertação Nacional (Colina, em que militou Dilma Rousseff), já faziam ações armadas, embora só depois do AI-5 tenha ocorrido o que Gorender chamou de “imersão geral na luta armada”.

Por sua vez, o argumento à direita não convence, afinal as ações armadas no período eram incipientes e controladas pelo regime, que dera conta de desbaratar a chamada guerrilha de Caparaó, liderada do exílio por Brizola em 1967, bem como os principais movimentos de massa de 1968, especialmente o estudantil e o operário, já desarticulados bem antes do “golpe dentro do golpe”, cuja radicalização se explica pela dinâmica interna de poder no interior do regime, como demonstrou por exemplo João Roberto Martins.4

Dito isso, é provável que muitos agentes de fato vissem na atividade do inimigo a razão da própria radicalização, e que as ações de uns levassem a reações de outros, numa ciranda de violência, ainda que desigual, dado o enorme poder da ditadura diante de uma esquerda armada aguerrida, mas pequena, dividida e socialmente pouco expressiva.

 

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Moradores do Araguaia abordados durante operação do Exército no período da Guerrilha do Araguaia5

 

Sibila: O que significa a presença de José Sarney da UDN até hoje, passando pelo golpe de 1964? Com ele liderando a transição, não se fez uma Comissão da Verdade. Como o senhor explica uma transição para a democracia sem uma Comissão da Verdade e sem a punição dos militares e dos “excessos” (formalmente crimes) dos aparelhos de esquerda? O assassinato, por exemplo, de Henning Boilesen, foi excessivo ou justo? Pode uma execução extrajudicial ser justa? Se o for, quando praticada pela esquerda, não o será também quando praticada pelo aparelho de Estado?

Ridenti: Para derrotar politicamente a ditadura e assegurar a governabilidade posteriormente, foram feitas – por todos os principais partidos – alianças políticas com setores civis que apoiaram o regime. Isso contribuiu para evitar os processos penais, mas em contrapartida a legislação de reparação civil aos perseguidos seguiu em direção oposta, como demonstrou por exemplo a tese de Glenda Mezarobba.6 Mais um episódio da velha conciliação à brasileira.

O caso Boilesen remete à questão do uso da violência política. Até que ponto ela seria legítima? A questão é intrincada, parecem mais complicados os casos de “justiçamento de companheiros”, acusados – ademais, falsamente – de colaborar com a repressão. A morte de Boilesen provavelmente foi um erro político, que custou caro aos que a tramaram. Mas que meios eles tinham para punir um torturador? Apelar para a “justiça” de um Estado ditatorial que usava e abusava da tortura? Lembrem-se os casos das execuções de oficiais alemães pela resistência francesa durante a ocupação nazista. Elas custaram caro à resistência, pois em represália os alemães executavam inúmeros civis para cada soldado morto. Caberia questionar o caráter extrajudicial dessas execuções promovidas pela resistência? Elas seriam equiparáveis às execuções promovidas pelo Estado nazista? Parece-me descabido comparar a “execução extrajudicial” de um torturador ou de um invasor, por parte de grupos políticos numa ditadura, com as ações terroristas do aparelho de Estado.

Hoje o discurso hegemônico equipara ao terrorismo qualquer uso da violência política de oposição à ordem. A questão é mais complexa e nem sempre foi tratada assim. Nos anos 1960, por exemplo, o filósofo Sartre saiu em defesa da legitimidade da violência dos oprimidos na Argélia e em Cuba. Ele escrevera peças como Mortos sem sepultura, que em 1946 tratava da resistência francesa e teve uma montagem de êxito no Brasil em 1977, sob direção de Fernando Peixoto.

Entretanto, aqui se pode lembrar que a justiça do regime militar abria frestas que permitiam alguma ação institucional, como a luta do promotor Hélio Bicudo contra os crimes do Esquadrão da Morte, que levaram à condenação do delegado Fleury, obrigando o regime a criar uma lei “casuística”, como se dizia na época, para que ele não fosse preso.

 

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Sibila: A fragilidade do Poder Judiciário, do Ministério Público e da polícia decorre em parte da impunidade dos agentes de 1964?

Ridenti: Em parte sim, mas cabe lembrar dois aspectos: 1. a formatação atual dessas instituições tem origem no tempo da ditadura; 2. mais importante que punir os agentes torturadores imediatos seria desvendar as cadeias de comando político que levariam até os presidentes-generais e aos empresários financiadores da tortura, não se restringindo aos brucutus que obedeciam a ordens.

Sibila: Considerando as teorias da Nova História e do culturalismo, gostaria que o senhor falasse um pouco de fatos como Sergio Paranhos Fleury ter sido guarda-costas de Roberto Carlos de 1965 a 1968 e guarda-costas de todo o pessoal da Jovem Guarda – criada pela agência de publicidade de Carlito Maia, irmão de Dulce Maia (da ALN). Roberto Carlos elogiou em 1973 o general Pinochet, chamando-o de “senhor presidente, Don Augusto Pinochet”. Houve colaboração de artistas com o regime militar em geral e com a OBAN e o DOI-CODI em particular?

Ridenti: Roberto Carlos é um caso interessante. A questão refere-se a sua participação, em 1975, no Festival de Viña del Mar, no Chile, em que fez agradecimento público a Pinochet pela honra de contar com a presença do chefe de Estado no espetáculo.7 Entretanto, como hoje é sabido, Roberto compôs Debaixo dos caracois dos seus cabelos em homenagem a Caetano Veloso no exílio. Ademais, como escrevi num artigo recente,8 algumas das canções de Roberto, que poucos considerariam na época como politizadas, tiveram seu sentido utópico potencializado em outros contextos. Caso de Eu quero apenas, interpretada em castelhano por um coro de crianças, em propaganda de televisão difundida pelo governo vitorioso após a revolução sandinista de 1979 na Nicarágua. A canção foi interpretada pelos sandinistas como amálgama entre utopias cristãs e socialistas, que inspiraram uma revolução de laços fortes com a Teologia da Libertação, ao falar em “quintal sem muro”, em dividir o resultado da pescaria com um milhão de amigos, ao desejar que no futuro o filho pudesse cantar livremente. A gravação original foi realizada em plena vigência da censura no Brasil, em 1974, que entretanto não detectou intenção subversiva por parte de Roberto Carlos. Ele era aprovado pelo regime por seu assumido distanciamento de questões políticas e até mesmo eventuais colaborações com iniciativas governamentais, como no sesquicentenário da independência nacional em 1972, em que o “rei da juventude” esteve ao lado de artistas tidos como de esquerda, caso de Elis Regina.

Elis interpretou canções engajadas ao longo de toda a ditadura, mas gravou uma propaganda oficial de televisão, na qual Roberto e vários artistas convidavam o povo a cantar o hino nacional, em comemoração ao sesquicentenário. Ela aceitou ainda convite para cantar na Olimpíada do Exército, em 1972. Resultado: foi desenhada por Henfil em suas tirinhas publicadas no semanário O Pasquim, onde criou o cemitério de mortos-vivos do personagem Caboco Mamadô, para onde eram mandados aqueles que o cartunista considerava coniventes com a ditadura, caso de Pelé, Roberto Carlos, dos atores Paulo Gracindo, Marília Pera, Tarcísio Meira e Glória Menezes, retratados na mesma charge com Elis.9 O cantor Wilson Simonal, o dramaturgo Nelson Rodrigues, o documentarista Jean Manzon, a cantora Eliana Pitman e outros também foram para o cemitério dos mortos-vivos, devido a episódios de apoio ao regime, que era louvado também em canções sertanejas. Era comum um mesmo artista dar mostras ora de colaboração com o regime militar, ora de crítica a ele, dependendo do momento – vejam-se os exemplos enumerados por Paulo César de Araújo.10

Uma pista para compreender a incoerência aparente pode ser encontrada não só em pontos de intersecção entre nacionalismos de direita e de esquerda, mas especialmente na inserção do artista no mercado cultural e nas lutas internas de cada campo profissional, procurando situar-se em relação às pressões e expectativas desencontradas dos pares, dos financiadores e do público, num quadro de modernização autoritária da sociedade, propício à geração de ambiguidades.

 

Chico Buarque e seu pai, Sergio Buarque de Hollanda, em anúncio de um banco “amigo da família” (1968)
Chico Buarque e seu pai, Sergio Buarque de Hollanda, em anúncio de um banco “amigo da família” (1968)

 

Sibila: Com o senhor avalia o fato de Fleury ter tido como amante, de 1977 a 1979, Eleonora Rodrigues, irmã de Raimundo Pereira (jornais Opinião e Movimento)? Essa promiscuidade percorre até hoje a sociedade e a cultura brasileira?

Ridenti: Sim, ocorre, é só ver a multiplicidade dos apoios angariados por exemplo por políticos que vão do falecido baiano Antonio Carlos Magalhães até Lula. Geleia geral. Intelectuais e artistas fazem parte das elites em sua diversidade, às vezes arvorando-se em falar em nome do Brasil como um todo. Como disse, os artistas estão inseridos na indústria cultural e nas lutas internas de seus campos artísticos, procurando responder às pressões e expectativas desencontradas dos pares, dos financiadores e do público. Poucos deles têm consciência desses processos; os mais críticos paradoxalmente são os que mais se beneficiam simbolicamente deles, caso de Caetano Veloso e Chico Buarque, cada um a seu modo.

 

Stones em Nova York, 1964
Stones em Nova York, 1964

 

Sibila: Paris e Londres eram as referências gerais. Uma parte dos intelectuais seguia Paris (campo socialista) e outra, Londres (“pós-política”, experimentando música, sexo livre e marijuana, marcada pela contracultura, “subversiva” aos olhos dos militares). Parece que, ao longo do tempo, a linha londrina prevaleceu na cultura brasileira. O senhor concorda? Isso tem relação com 1964?

Ridenti: A polarização pode ser válida como uma aproximação típico-ideal. Mas as divergências não se reduziam às dualidades que alguns rotulavam como revolução x rebeldia; socialismo x desbunde; realismo x contracultura; Paris x Londres; Chico x Caetano, Arena x Oficina. Ao estudar os casos concretos, tudo isto estava muito misturado. Só um exemplo: Frei Betto foi por um tempo assistente de Zé Celso no teatro Oficina, onde atuavam Dulce Maia, ligada à guerrilha, e Fernando Peixoto, ao PCB… Brigava-se muito dentro dos meios artísticos e intelectuais mais politizados, que em geral eram originários das classes médias. Mas todos pertenciam a uma mesma família cultural e política que, nos anos 1960, desejava transformações de fundo na sociedade brasileira e acabou reintegrada à ordem. Seus projetos foram derrotados, tanto da turma “de Paris” como da “de Londres”, a menos que se considere que uma das duas ou ambas fossem no fundo um prenúncio necessário do que Jameson chamou de atomização reificada da sociedade. Paradoxalmente, muitos sujeitos envolvidos encontraram êxito profissional individual, quer como artistas, políticos de carreira, funcionários ou empresários. FHC, Lula e Dilma chegaram até à Presidência da República, Gil foi ministro. Mas prefiro não ver a história passada como se ela necessariamente tivesse de desembocar no que temos no presente. Havia outras veredas que se perderam, alguns veios talvez possam ser retomados.

Sibila: Como o senhor vê o rebaixamento cultural brasileiro de hoje? Ele tem causas em 1964? Ou com a civilização global do espetáculo, na qual o entretenimento substituiu a cultura em si, na qual a arte se tornou uma arte simplificada e sem referências que perturbem sua recepção?

Ridenti: Não haveria certa idealização do passado e uma posição elitista em detectar “o rebaixamento cultural” de hoje? De fato, parece que especialmente depois de 1964 se impôs a lógica mercantil, de atomização reificada da sociedade e da cultura, com o império do espetáculo e do entretenimento. Mas junto com a massificação da indústria da cultura veio também, indissociável, certa democratização. Ou seja, houve ampliação expressiva do acesso à educação e à cultura, mas num quadro de submissão à racionalidade da sociedade produtora de mercadorias. A tendência nos últimos 50 anos foi criar condições para o desenvolvimento da indústria cultural no Brasil, em seu duplo aspecto de produção de mercadorias simbólicas diversas mas padronizadas e de lógica cultural no capitalismo tardio, pela qual todos se submetem à unidade da produção e mercantilização, que impõe seu próprio ritmo, dirigindo e disciplinando as necessidades dos consumidores.

Paralelamente, apesar das críticas generalizadas quanto à queda na qualidade, a escolaridade média da população aumentou com a massificação do ensino público de primeiro grau, e também com o crescimento do Ensino Médio. Conforme os censos do IBGE, a taxa de analfabetismo era de 39,7% em 1960, 25,5% em 1980, ficou em 13,6% no ano 2000 e 8,7% em 2013. Particularmente na população entre 15 e 19 anos, o percentual de analfabetos caiu de 16,5% em 1980, para 5% em 2000. Então, houve expressiva diminuição no índice de iletrados, apesar de o índice de analfabetos funcionais ser alto.

No tempo da ditadura foi criada uma rede de universidades federais e um sólido sistema nacional de pós-graduação, especialmente na universidade pública. Ademais, nos últimos quarenta anos do século XX, houve expressiva e contínua ampliação de vagas no Ensino Superior, notadamente no período noturno, em escolas particulares, mesmo que muitas delas fossem de baixa qualidade e fizessem do ensino um negócio voltado, sobretudo, para o lucro fácil, o que talvez ajude a explicar o alto índice de evasão escolar.
Independentemente disso, a evolução quantitativa foi impressionante. Em 1960, havia apenas 35.909 vagas disponíveis anualmente para entrada no ensino superior, número que saltou para 57.342 em 1964, ano do golpe de Estado, chegando a 89.582 no tempo das revoltas estudantis de 1968. Houve mais crescimento ao longo do tempo: 202.110 vagas oferecidas em 1971, 417.348 em 1981, 516.663 em 1991, até as 1.265.175 vagas de 2001. Neste ano, havia 1.391 instituições de Ensino Superior, com aproximadamente 3 milhões de alunos matriculados. O crescimento foi ainda mais substantivo no começo do novo século: o total de alunos já passava de sete milhões em 2013, três quartos deles no ensino privado, invertendo a situação que prevalecia na década de 1960, quando predominavam as vagas no setor público. Mesmo assim, atestando as enormes desigualdades ainda prevalecentes, dados do Pnad/Ibge apontavam que, em 2009, cerca de 70% dos jovens entre 18 e 24 anos não frequentavam escola, muitos deles fazendo parte do “nem nem”, nem escola e nem trabalho.11

Em 2005 havia 35,3 milhões de brasileiros conectados à internet; em 2012 já eram 94,2 milhões, conforme dados do Ibope, quase a metade da população. Com isso, o Brasil tornou-se o quinto país do mundo em conexões.12 Os números da produção de livros e outros produtos culturais também são impressionantes.

Em suma, considero questionável falar em “rebaixamento cultural brasileiro de hoje”, prefiro pensar num processo complexo, ambíguo e amalgamado entre massificação e democratização da cultura.

Sibila: Aprofundando a questão anterior, por que parece não haver mais condições para uma arte crítica no Brasil? Trata-se do fim das utopias, da globalização, do consumismo, do narcisismo “Facebook”, em suma, do “espírito da época”, incluindo certa “demissão da crítica”, em grande parte mercadologizada, como, aliás, a própria mídia, ou o modelo social e econômico brasileiro é parte necessária da resposta, de que o atrasado modelo “agrário”, isto é, agroexportador, é exemplo e talvez parte implicada?

Ridenti: Penso que uma arte crítica expressiva não se sustenta por si mesma, só pode estar associada a movimentos críticos mais amplos. Walter Garcia, colega da USP, argumenta que os Racionais MC’s produziram canções verdadeiramente revolucionárias nos anos 1990.13 O pessoal do Arte contra a barbárie também teve seu peso sobretudo no teatro. As manifestações de junho de 2013 dariam o que pensar, mas seria tema para uma outra conversa.

 

Norma Bengel em Os cafajestes, direção Ruy Guerra, 1962.
Norma Bengel em Os cafajestes, direção Ruy Guerra, 1962.

 

Sibila: Por que não há políticas públicas para a cultura no Brasil? Por que a cultura é tratada como evento? Por que tantos eventos culturais vazios no Brasil? Por que tanta festa literária e tão pouca literatura relevante?

Ridenti: Bem, é a lógica predominante da produção de mercadorias culturais. Mas em meio ao financiamento dos eventos, tem espaço também para os pontos de cultura, para apoio a iniciativas de teatro alternativo. A “literatura relevante” talvez ainda seja um jardim exuberante que está escondido em meio à floresta espessa do entretenimento. A batalha por políticas culturais com uma outra lógica segue em curso.

Sibila: João Cabral, em duas conferências famosas, de 1952 e 1954, já discorria sobre o problema do fatal (mais uma vez) distanciamento moderno do público de poesia. As coisas pioraram ou melhoraram, paradoxalmente, durante o regime militar? Alguns poemas de A rosa do povo, de Drummond (1944), ou “A rosa de Hiroshima” de Vinicius (1954), e livros como Poema sujo de Gullar, tiveram então certa popularidade, pela temática politizada, e parecem ter conseguido manter a poesia dentro de um contexto de certa efervescência político-cultural reativa, que incluía o teatro (Arena, Opinião etc.), a música popular e mesmo a prosa, como no caso das coletâneas de contos brutalistas de Rubem Fonseca dos anos 1970. Se houve melhora ou piora em relação à situação descrita por Cabral nos anos 1950, ou melhora pontual e piora geral, e outras variações, estas se amenizaram ou se acentuaram com a redemocratização à brasileira?

Ridenti: A massificação cultural leva a um montão de problemas que aparecem nas questões formuladas. Mas gostaria de não perder a esperança na democratização potencial da cultura que vem junto com ela, e que permite pensar no sucesso inesperado por exemplo da edição da obra poética de Leminski, ou das novas edições de poetas como Drummond e Vinicius de Moraes. Bem ou mal, é muita gente que vem tendo mais acesso à escola e à produção cultural.

Sibila: À época do golpe militar, o mercado editorial brasileiro era bastante apequenado. Os números de novos títulos, de traduções, de leitores etc., eram mínimos, incluindo a esfera acadêmica. Além disso, serviam a uma pequena intelligentsia de escritores, críticos, intelectuais etc. Não havia nem um público de massa nem um público médio de literatura “média”, de mercado. Hoje este público está em formação e, segundo os otimistas, em ascensão, mas em detrimento daquela intelligentsia, hoje minguada em sua influência e mesmo em sua existência, substituída pelos algo fantasmáticos “formadores de opinião”. Concorda com esta avaliação, que parece seguir certo modelo brasileiro de ganhar por perdas, assim como o advento das rodovias se deu em detrimento da manutenção da rede ferroviária já instalada desde o século XIX, e não por sua integração ou somatória?

Ridenti: Esse processo de massificação/democratização é mundial, não se restringe ao Brasil, cada vez mais integrado ao mercado global. O âmbito dos intelectuais está ligado a esse processo, por exemplo, andamos cada vez mais especializados, com tendência a perder o contato com visões de conjunto. Talvez não haja mais possibilidade de produzir os poucos e excelentes de antanho, mas já há muitos bons ou quase bons. A vida intelectual passou a concentrar-se sobretudo nas universidades, foi institucionalizada, o que de certo modo tende a domar o pensamento em parâmetros convencionais.

Talvez haja hoje menos expoentes de criatividade, mas bem mais profissionalismo. Um exemplo: certo músico paulistano comentou que, nos anos 1960 e 1970, quando viajava para fazer shows no interior, precisava levar com ele outros colegas de São Paulo ou Rio de Janeiro. Hoje, só leva as partituras, pois em toda parte encontra músicos aptos a acompanhá-lo.

Sibila: A literatura brasileira, hoje, cresce por diluição, em mais de um sentido, em meio a um mercado polimorfo e à convivência com a internet, seja no caso da publicação em e-books ou da reedição eletrônica e dos downloads, seja no caso de criações originais feitas na rede e para a rede, que podem ou não vir a ser publicadas em livro. Ao mesmo tempo, o mercado editorial em si também cresce, ainda que manco, pois centrado e concentrado em modismos mercadológico-literários. Mesmo a poesia encontra, apesar de muito pontualmente, espaços passageiros de grande presença, de é exemplo a recente publicação da obra poética completa de Paulo Leminski, que se tornou um best-seller. Como pode, se pode, a literatura contemporânea voltar a ter alguma influência cultural? Neste caso, o período do regime militar ficará na história como seu último momento de presença forte, apesar de tudo?

Ridenti: Provavelmente essa presença literária forte nos moldes do passado já não possa mais ocorrer. Estamos num tempo de preponderância audiovisual e informática, que entretanto abre novas possibilidades para a difusão da palavra escrita. Não será em nossa sociedade reificada que isso acontecerá, mas talvez estejam sendo criadas as condições materiais para que um dia todos possam ser poetas, atores, pintores, sem que o trabalho artístico se restrinja a especialistas. Acho importante manter a utopia da produção de uma cultura comum, sem a “aura” mística da obra de arte, que expresse a plena realização de uma sociedade em que “o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos”…

Sibila: Se as mentalidades são mesmo prisões de longa duração, podemos afirmar que há uma característica histórica permanente na mentalidade brasileira? Qual?

Ridenti: Não é só uma questão de mentalidade, pois esta se liga à produção da sociedade como um todo, conforme propõe o materialismo cultural de Raymond Williams. Diria que a permanência no Brasil é a da cultura da conciliação.144 Mas essa mentalidade forjada pelas classes dirigentes não é um pensamento solto no ar, liga-se à história do país, ao que se chamou nas perguntas iniciais de modernização conservadora, de mudar para que tudo permaneça como está, mantendo-se a desigualdade. O golpe de 1964 ocorreu em defesa dessa “mentalidade” e da estrutura social em que ela se assenta, até hoje vigentes, que estavam sendo questionadas por setores expressivos da população.

 


Notas

  1. Jabob Gorender. Combate nas trevas: a esquerda brasileira: das ilusões perdidas à luta armada. São Paulo: Ática, 1987. [5.ed. rev. e ampl. São Paulo: Ática, 1998].
  2. Armando Boito Jr. O sindicalismo de Estado no Brasil. Campinas: São Paulo: Unicamp/Hucitec, 1991.
  3. Marcelo Ridenti. O fantasma da revolução brasileira. 2.ed. rev. e ampl.: São Paulo: Ed. Unesp, 2010.
  4. João Roberto Martins Filho. O palácio e a caserna. São Carlos: UFSCar, 1995.
  5. Fonte: http://acervo.oglobo.globo.com/fotogalerias/guerrilha-do-araguaia-9529189#ixzz2sMnXtrcC.
  6. Glenda Mezarobba. O preço do esquecimento: as reparações pagas às vítimas do regime militar. São Paulo, 2008. Tese (Doutorado em Ciência Política), USP.
  7. Video disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=eEYPf6yfm-I. Consulta em 21 de janeiro de 2014.
  8. Trata-se do capítulo sobre “Cultura” do livro organizado por Daniel Aarão Reis, A busca da democracia, 1964-2010. História do Brasil Nação, vol.5, 1964-2010. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014.
  9. O caso foi relatado em artigo de Sérgio Luz, reproduzido por várias publicações e na internet. “Elis – do inferno ao paraíso”. In http://maniadehistoria.wordpress.com/2009/04/01/elis-regina-a-ditadura-militar-e-lula/, consultado em 21/01/2014.
  10. Paulo Cesar de Araújo.Eu não sou cachorro, não: música popular cafona e ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2002. Em capítulo de meu livro Brasilidade revolucionária (ed. Unesp, 2010), também me detenho nos casos dos irmãos Valle, Jorge Ben, Dom e Ravel, a banda Os incríveis e outros que ora apoiavam e ora criticavam o regime.
  11. Os dados do censo da educação superior de 2010 estão disponíveis em http://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2010/divulgacao_censo_2010.pdf. Acesso em 25/01/2014.
  12. http://tobeguarany.com/internet_no_brasil.php. Acesso em 25/01/2014.
  13. Walter Garcia. Sobre uma cena de “Fim de semana no Parque”, do Racionais MC’s. Estudos Avançados (USP. Impresso), v. 25, p. 221-235, 2011.
  14. Ver, por exemplo, o artigo de Rodrigo Patto Sá Motta no livro organizado por Daniel Aarão Reis et al. A ditadura que mudou o Brasil – 50 anos do golpe de 1964. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

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 Sobre Marcelo Ridenti

É professor titular do Departamento de Sociologia da UNICAMP. Foi professor na Universidade Estadual de Londrina (1983-1990), na Universidade Estadual Paulista, Araraquara (1990-1998). Graduou-se em Ciências Sociais (1982) e em Direito (1983) na Universidade de São Paulo, onde concluiu o doutorado em Sociologia (1989). Defendeu tese de livre docência em Sociologia na Unicamp (1999). Autor dos livros Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV (Record, 2000), O fantasma da revolução brasileira (Editora Unesp, 1993), Classes sociais e representação (Cortez, 1994), Professores e ativistas da esfera pública (Cortez, 1995), Política pra quê? Atuação partidária no Brasil contemporâneo (Atual, 1992). Organizador de História do Marxismo no Brasil, vol. 5 – Partidos e organizações dos anos 20 aos anos 60 (Editora Unicamp, 2002, em parceria com Daniel Aarão Reis); Intelectuais: sociedade e política – Brasil-França (Cortez, 2003, em parceria com Elide Rugai Bastos e Denis Rolland; obra publicada também na França, ed. L’Harmattan, 2003); O golpe e a ditadura militar, 40 anos depois, 1964-2004 (ed. Edusc, 2004, em pareceria com Daniel Aarão Reis e Rodrigo Patto Sá Motta). Desenvolve pesquisas sobre intelectuais e artistas, bem como sobre partidos e movimentos de esquerda.