Sibila reproduz o artigo a seguir, da controvertida Jan Moir, a fim de exemplificar como hoje podem ser vistas as duas principais musas históricas dos Rolling Stones. As duas mulheres a que o artigo é dedicado, Anita Pallenberg (1944-2017) e Marianne Faithfull, nascida em 1946, que superou em maio agora a covid-19, são tratadas não como protagonistas de suas vidas, mas como vítimas de homens (patriarcais), substâncias e modismos, ou seja, como mulheres convencionais no fundo. Elas que viveram de maneira intensa uma época de uma nova liberdade cultural, estética e comportamental– que aqui se pretende ver pelo avesso (ao custo de apagar, de modo duvidoso, qualquer indício de liberdade de ação das duas mulheres reduzidas a vítimas). É um outro ângulo e vale para o debate. Faithfull conseguiu, apesar dos “tropeços”, ter uma carreira musical respeitada. Sibila
Talvez a coisa mais notável sobre Anita Pallenberg seja ela ter conseguido viver tanto. A fabulosa rock chick original morreu nesta semana aos 73 anos – embora a revista Rolling Stone afirme que ela tinha 75 anos, a afronta final.
Sua veterana companheira rockette, Marianne Faithfull, postou uma homenagem à sua grande amiga no Facebook. “Eu realmente a amava. Ela me ensinou muito, especialmente depois que nós duas ficamos `limpas’”.
O que diz tudo, invocando o glamouroso antes e o sombrio depois em suas vidas estreladas. Ainda assim, quão amigáveis ela se mantiveram, apesar da bebida, das drogas e dos vícios vorazes que demandaram e danificaram ambas. Irmãs sob a pele marcada.
É mérito delas que Pallenberg e Faithfull conseguiram salvar alguma aparência de bondade dos destroços de suas vidas. No entanto, sempre me senti desconfortável com sua celebração entusiástica pelas novas gerações de feministas e fãs; devotos de olhos arregalados que não podem ver além dos moles chapéus de veludo e do “hippie chique” dos anos 1960.
Pallenberg pode ter sabido usar peles e jeans skinny, mas passou seus anos mais vitais imersa em uma névoa de heroína. Faithfull também.
No entanto, elas são idolatradas por celebridades da moda como Kate Moss e Alexa Chung, modelo-tornada-designer, e até festejadas por Jennifer Saunders, que escreveu partes para as duas em um episódio de “Absolutely Fabulous”.
Em alguns aspectos, são de fato mulheres admiráveis – mas certamente suas aventuras ousadas devem servir de alerta para as meninas, não de inspiração.
Pallenberg e Faithfull se conheciam há 52 anos, desde o dia em que se tornaram as WAGs [wives and girlfriends] oficiais dos Rolling Stones – Anita principalmente com Keith Richards , Marianne principalmente com Mick Jagger.
Cada uma dormia com outros membros da banda – e Richards uma vez admitiu que ele dormiu com Marianne por vingança depois que Jagger dormira com Anita. O que parece sugerir que o amor livre e a libertação sexual dos anos 1960 eram construções que favoreciam muito mais os homens do que as suplicantes mulheres.
Olhe para Jagger hoje, ainda brincando e tendo bebês com meninas com menos de metade da sua idade, deixando um rastro de mulheres quebradas e relacionamentos fraturados em seu caminho. Ele é o patriarcado feito carne, um pau grisalho de luxúria egoísta, um homem que nunca cresceu.
Ao menos Keith Richards teve a gentileza de se manifestar sobre a morte de sua ex-namorada e mãe de dois de seus filhos.
Pallenberg era de origem ítalo-alemã e educadamente descrita como atriz, modelo e designer de moda. Na melhor das hipóteses, ela era uma diletante. Na pior, não era nenhuma dessas coisas. Dizia-se que foi uma musa dos Stones, mas acho que isso significava que ela uma vez encorajou Jagger a usar uma camisa com babados.
Sua notoriedade e fama esfumaçada surgiram dos homens com quem ela se associou, não de qualquer coisa que alcançou. Ela namorou o fundador do Stones, Brian Jones, havia rumores de ter tido um caso com Mick Jagger e teve três filhos com Richards, um dos quais morreu bebê.
Richards afirmou, em sua autobiografia de 2010, que a única razão pela qual ainda estava vivo e porque tomava drogas de alta qualidade – de um nível farmacêutico não disponível nas ruas.
Supõe-se que isso também deve valer para sua amiga drogadita Pallenberg.
Ele também afirmou que os dois ainda poderiam estar juntos se ela tivesse abandonado a heroína quando ele o fez, em 1978. Eles se separaram um ano depois e ela lutou como viciada por mais nove anos, antes de entrar na reabilitação em 1987. Naquela época, Richards era casado com a modelo Patti Hansen e tinha duas filhas. Pallenberg nunca se casou, nem encontrou um amor duradouro.
Ao mesmo tempo, Faithfull tinha seus próprios problemas. Quando conheceu Jagger, em meados dos anos 1960, ela se casara, tivera um bebê, se separara do marido e perdera a guarda do filho.
Ela participou de um filme soft-porn, abortou um filho de Jagger, tentou cometer suicídio na Austrália, foi denunciada pelo Vaticano, abandonou Jagger e acabou vivendo pelas ruas do Soho londrino nos anos 1970, até ressugir com o disco Broken English, de 1979. Foi tragada pelas drogas por quase 20 anos.
Anita declarou que a heroína a congelou emocionalmente, enquanto Marianne alegou que era incapaz de fazer sexo sem estar anestesiada por um coquetel de bebidas e drogas. Anita tinha inúmeros problemas de saúde e precisou substituir dois ossos dos quadris. O vício em heroína de Marianne a deixou com má circulação, artrite e hipoglicemia. Onde, por favor, está o glamour disso tudo?
O que torna tudo isso ainda pior é que elas são mais educadas, mais inteligentes e mais sofisticadas do que os velhacos dos Rolling Stones, aos quais deram os melhores anos de suas vidas – apenas para serem descartadas quando algo mais suculento surgisse.
Tarde demais, elas aprenderam que é melhor escrever sua própria música do que ser a beleza que está sendo cantada. O que leva a uma vida inteira sendo comparada ao seu próprio eu mais jovem e mais belo – que está há muito em falta.
Em seus últimos anos de vida, a ex-garota selvagem Anita finalmente sucumbiu ao conforto da classe média. Formou-se em moda, cursou desenho botânico e adorava jardinagem.
Ela cultivou morangos, alcachofras, alho-poró e favas. “Coisas italianas”, afirmou, porque era estilosa mesmo em questões agrícolas. Anita Pallenberg não era o tipo de mulher que cultivava nabos.
Agora que ela se foi, é ainda mais difícil descobrir se era uma vítima ou uma sobrevivente de seu legado Rolling Stones.
Talvez um pouco dos dois?
No Moon in Paris (2018)
Marianne Faithfull
Jan Moir (1958) é uma colunista e polemista britânica. Ela trabalha no Daily Mail (um jornal de direita). Diversos de seus artigos receberam muitas críticas.