Skip to main content

Contra o fascismo

Como filho de comunistas e neto de comunistas históricos (um dos meus tios-avôs, Noé Gertel, fez parte do Comitê Central do PCB nos tempos de Prestes e esteve preso na Ilha Grande ao lado de Graciliano Ramos), fui educado como comunista, e fui comunista até 1979. Meu processo particular e peculiar de afastamento da esquerda foi imprevisivelmente deflagrado pela Revolução Iraniana, pela tomada do poder em Teerã por uma teocracia islamofascista e pelo apoio da esquerda mundial a essa teocracia (Foucault, por exemplo, quase teve orgasmos públicos de júbilo pela ascensão de Khomeini). Nada de novo. Stálin se aliou a Hitler em 1939 (Pacto Nazi-Soviético) e foi um aliado importante do nazismo até ser traído por Hitler em 1941. A esquerda não é homogênea, salvo naquilo em que é, por exemplo, um vigoroso viés antiocidental que, neste momento, toma a forma oportunista de um antissionismo que, de fato, é um anti-israelismo que é, na verdade, antissemitismo (“Palestine will be free / from the River [Jordão] to the Sea [Mediterrâneo]: ou seja, livre de Israel e livre de judeus, como quer o Hamas [em alemão isso se diz, como se dizia em 1938, Judenrein, “livre de judeus”]). Nada de novo (ver, por exemplo, “Sobre a questão judaica”, escrito por Karl Marx, mas que poderia ter sido escrito por Joseph Goebbels). Assim como em 1979 a esquerda mundial aplaudiu a tomada do poder em Teerã pelo islamofascismo iraniano, hoje ela aplaude, de forma mais ou menos direta, mais ou menos velada, os islamofascistas homicidas do Hamas. Não se trata, neste momento, de ser pró Israel ou pró palestinos, mas, como em 1979, de ser inegociavelmente contra: contra o islamofascismo do Hamas. Hamas que não cometeu o ataque de 7/10 no sul de Israel. O Hamas é uma criação e um instrumento do Irã, o mesmo Irã islamofascista nascido em 1979. O ataque foi cometido pelo Irã (via Hamas) – assim como pelo Hamas (com apoio e empenho do Irã). Um não exclui o outro (ao contrário). Mas não creio que a maior parte da esquerda mundial e seu filoislamofascismo esteja enganada hoje como (não) esteve em 1979. Ela sabe o que faz (eu também sei).


 Sobre Luis Dolhnikoff

Luis Dolhnikoff estudou Medicina (1980-1985, FMUSP) e Letras Clássicas (1983-1985, FFLCH-USP). Entre 1990 e 1994, co-organizou em São Paulo, ao lado de Haroldo de Campos, o Bloomsday SP, homenagem anual a James Joyce. Em 2005, recebeu uma Bolsa Vitae de Artes para estudar a vida e a obra do poeta Pedro Xisto. Entre 2006 e 20014, foi articulista de política internacional na Revista 18, do Centro de Cultura Judaica de São Paulo. Como crítico literário e articulista, colaborou, a partir de 1997, com os jornais O Estado de S. Paulo, A Notícia, Diário Catarinense, Gazeta do Povo, Clarín e, recentemente, Folha de S. Paulo, bem como em várias revistas. É autor do livro de contos Os homens de ferro (São Paulo, Olavobrás, 1992), além dos livros de poemas Pânico (São Paulo, Expressão, 1986, apresentação Paulo Leminski), Impressões digitais (São Paulo, Olavobrás, 1990), Lodo (São Paulo, Ateliê, 2009), As rugosidades do caos (São Paulo, Quatro Cantos, 2015, apresentação Aurora Bernardini, finalista do Prêmio Jabuti 2016) e Impressões do pântano (São Paulo, Quatro Cantos, 2020).