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Luis Dolhnikoff e a Casa das Rosas

Não sou poeta, não sou escritora, não moro em São Paulo, não conheço círculos de literatos, sou basicamente uma filistina. Posto isso: sou brasileira, tenho cpf, tenho rg, pago meus impostos, acredito na democracia e acredito que vivemos numa democracia. No meu tempo de infância, durante o governo Juscelino e Jango, tinha uma matéria na escola primária que se chamava “educação moral e cívica”. Veio o golpe militar, a tal educação moral e cívica, nem lembro o que aconteceu com ela. Mas lembro que, aos sete, oito, até os dez anos de idade, a gente aprendia a respeito da  Constituição brasileira, os direitos fundamentais do cidadão etc. Por isso, creio eu, cresci com a convicção e a serenidade de que eu podia – sozinha, como cidadã – me dirigir a qualquer instituição pública dessa nossa república e expor minhas questões, minhas dúvidas, meus questionamentos sobre as coisas de interesse da sociedade. Por isso achei absolutamente natural e mais do que pertinente um artigo de Luís Dolhnikoff indagando – muito civilmente, muito civicamente e muito civilizadamente – sobre o estado e os rumos da Casa das Rosas, em São |Paulo. Não tenho muita paciência para me delongar sobre o assunto, que realmente anda beirando as raias da sandice, e remeto o leitor apenas ao artigo – são, sadio, saudável, salubre e todas as redundâncias que se fizerem necessárias – de Luís Dolhnikoff, que está aqui.

Todos os desvarios em torno, manifestações apressadas, desqualificações cruéis, miasmas de sarjeta, capanguismos empreguistas, a pior das piores heranças coloniais deste pobre país: tudo isso que o lúcido artigo de Dolhnikoff suscitou – espantosamente! – serve apenas para desviar a atenção do que realmente importa. E a truculência das reações despertadas pelo artigo, sobretudo no diretor responsável pela Casa das Rosas, chegou a tal ponto que, a meu ver, o que está em questão agora nem é mais a gestão assim-ou-assado da Casa das Rosas, mas a própria relação entre estado e sociedade, instituição pública e cidadania.

Meu ponto é: para sermos cidadãos, temos de agir como cidadãos. Luís Dolhnikoff está em seu pleno direito ao indagar dos rumos de uma instituição pública como é a Casa das Rosas, e merecem resposta séria e honesta, em lugar desses urros que andam ensurdecendo qualquer pessoa de bem. A questão de fundo não pode se perder na barbárie e deve ser vigorosamente defendida: o direito de todos nós, como cidadãos, sermos ouvidos e termos o encaminhamento correto de nossas legítimas cobranças em prol do bom funcionamento, transparente e democrático, de nossas instituições públicas. Denise Botman

Este artigo foi publicado em 22 de fevereiro no blog “Não gosto de plágio”, de Denise Botman, em 22 de fevereiro de 2012.


 Sobre Denise Bottman

Nasceu em Curitiba em 1954. Graduou-se em história pela Universidade Federal do Paraná; é mestre em teoria da história e doutora em epistemologia da história. Foi docente de filosofia da Unicamp. É autora de Padrões explicativos na historiografia brasileira e vários artigos de crítica e teoria historiográfica em revistas especializadas. Atua como tradutora de inglês, francês e italiano desde 1985, nas áreas de ciências humanas, história da arte, teoria e história literária.