José Paulo Paes: Crítica Reunida sobre Literatura Brasileira & Inéditos em Livros reúne em dois volumes ensaios dedicados a poetas e ficcionistas do século 16 ao 20, textos que não eram tão acessíveis aos leitores, e leva o trabalho de José Paulo Paes (1926-1998) a quem não é familiarizado com o autor.
Autor de dezenas de livros e vencedor de prêmios (entre eles o Jabuti 1991 na categoria Infantil com Poemas para brincar e o Jabuti 1997, Infantil e Livro do Ano Ficção, com Um passarinho me contou), o paulista José Paulo Paes é um intelectual respeitado desde os anos 1980, informa Fernando Paixão. “Sua obra publicada é muito extensa e envolve poesia, tradução, crítica literária e até a edição, pois durante muitos anos foi responsável pelos lançamentos da editora Cultrix”, acrescenta.
Nos textos selecionados, o autor se debruça sobre Castro Alves, Gregório de Matos, Machado de Assis, Monteiro Lobato, Augusto dos Anjos, Oswald de Andrade, Osman Lins, Graciliano Ramos, Erico Verissimo, Jorge Amado, Jacinta Passos, Lygia Fagundes Telles e Cecília Meireles, entre outros. “Os ensaios são importantes para a literatura brasileira, para o público geral e para estudantes, na medida em que, além de exemplares de um estilo que combina clareza e densidade analítica, abarcam grande variedade de autores e de épocas da nossa literatura”, ressalta Ieda Lebensztayn.
Os 150 ensaios que compõem os dois volumes (552 páginas e 544 páginas) estão organizados pela ordem em que foram escritos e publicados por José Paulo Paes, crítico autodidata. “Reúnem apenas os textos dedicados à literatura nacional e que foram por ele incluídos em livros diversos. Ou seja, aqui se encontra o melhor que o autor produziu no campo da crítica sobre nossos autores”, destaca Fernando Paixão, professor da Universidade de São Paulo (USP).
Há, também, artigos até então inéditos em livros, localizados em jornais e revistas do acervo da Biblioteca Nacional e no acervo pessoal do poeta, ensaísta e crítico literário. E mais uma seção com importantes ensaios da primeira fase do autor. José Paulo Paes escrevia para os cadernos de cultura dos principais jornais do Brasil.
Entrevista com os organizadores da obra
Pergunta – Como surgiu a ideia do livro?
Fernando Paixão – A intenção de fazer essa coletânea já vem de muito tempo, pois fui amigo de José Paulo Paes e tive a oportunidade de publicar alguns trabalhos dele na editora Ática. Seus livros de ensaios quase sempre reuniam os textos escritos pelo autor em certo período. E, como ele gostava de assuntos diversos, os sumários traziam assuntos diversos, temas “gregos e baianos”, como ele designou em uma dessas coletâneas. Um texto sobre a autora Frankenstein se encontrava ao lado de outro sobre Augusto dos Anjos ou sobre o samba de Adoniran Barbosa, por exemplo. Ora, em meio a essa diversidade, eu tinha a intuição de que ali se escondia uma visão muito particular sobre a literatura brasileira. Mas foi necessário passar muitos anos para a ideia se transformar em realidade. Isso só se tornou possível porque a Ieda Lebensztayn se associou ao projeto e fez toda uma pesquisa no acervo do autor para selecionar textos importantes do passado crítico do poeta. O entusiasmo do editor Plínio Martins Filho, da Ateliê, também foi determinante.
Pergunta – E como vocês fizeram a organização do livro?
Fernando Paixão – Os ensaios estão apresentados conforme a ordem em que o autor os publicou em livros, ao longo de sua trajetória, acrescidos de uma seção inédita. Dessa maneira, respeitamos a sequência natural em que foram escritos e publicados. Mas, tivemos a ideia de também acrescentar no final um índice cronológico de autores e de obras, que permite observar em sequência o olhar do crítico. É interessante ver, por exemplo, como ele dá muita atenção aos escritores da transição do século XIX para o seguinte, com especial atenção a Augusto dos Anjos e Graça Aranha. Também se verifica uma ênfase na análise dos livros e poetas modernistas – em especial Oswald e Mário de Andrade -; e surpreende o número de textos que escreveu sobre os jovens autores, tanto na poesia como na ficção.
Pergunta – Há alguma crítica que nunca foi publicada antes, em livros, jornais ou revistas, e só agora é divulgada?
Ieda Lebensztayn – O segundo volume traz ensaios inéditos em livros do autor, a maioria publicados na imprensa, sobretudo em suplementos culturais de grandes jornais. A exceção são dois textos cujos datiloscritos localizamos no acervo de José Paulo Paes, preparados por ele para simpósios em homenagem, respectivamente, a Oswald de Andrade e a Jorge Amado. “Oswald de Andrade, um Testemunho Pessoal”, de 1990, Paes redigiu para um ciclo comemorativo do centenário do poeta e prosador modernista, realizado pela UBE, União Brasileira de Escritores, em Santo André. E, redigido por ocasião do aniversário do romancista, o ensaio que intitulamos “Jorge Amado, Oitenta Anos” foi lido em 1992 em um evento da prefeitura de São Paulo e, inicialmente, no Simpósio Internacional de Estudos sobre Jorge Amado, em Salvador.
Pergunta – Gostaria que vocês falassem sobre a importância – para a literatura brasileira, para os leitores, para estudantes – da publicação dos ensaios reunidos de José Paulo Paes.
Ieda Lebensztayn – Esta publicação reúne um material crítico muito rico e que não era de fácil acesso: ensaios de José Paulo Paes a respeito de literatura brasileira, presentes em onze obras do crítico, bem como alguns até então inéditos em livros. O conjunto de artigos, levando-se em conta a verticalidade das análises e a abrangência das datas de publicação das obras estudadas, constitui uma historiografia hermenêutica da literatura brasileira. A relevância dos volumes advém da agudeza dos ensaios e de sua diversidade, não só quanto aos escritores estudados, mas também quanto aos temas e às abordagens, incluindo observações críticas pessoais e reflexões com maior embasamento teórico. Alguns artigos se detêm na obra de um só escritor, por exemplo Machado de Assis, outros são temáticos, como “O Pobre-Diabo no Romance Brasileiro”, e, entre os de viés teórico, sobressai “O Lugar do Outro”, que, com base em Ortega y Gasset, trata da “outridade figurativa”. Assim, é importante para os leitores conhecerem a obra de José Paulo Paes e esse sentido de olhar para o outro, por meio da ficção, da poesia e também da tradução, em busca de entender melhor o mundo, as relações em sociedade, seus impasses e seu potencial de beleza e de transformações.
Pergunta – O livro traz críticas sobre autores do século 16 ao século 20, com ensaios a respeito de livros, músicas e anúncio de publicidade. Vai do barroco aos modernistas e contemporâneos. O que a obra revela sobre José Paulo Paes?
Ieda Lebensztayn – Os ensaios revelam como Paes tinha vasta cultura literária e somava com flexibilidade e versatilidade os traços de crítico, poeta e tradutor. Sem ligações formais com a universidade, teve o privilégio de escolher livremente os assuntos e gêneros abordados, incluindo livros, músicas, anúncios de publicidade, longe de se fechar num gosto exclusivista. E assim exerceu sua consciência quanto às palavras e às dimensões sociais e subjetivas da realidade, cultivando valores estéticos e éticos. Como condensam os títulos Mistério em Casa (emprestado de Raul Bopp) e Gregos & Baianos, os artigos deixam ver que a prática intelectual de Paes somava o empenho por conhecer a tradição – da literatura ocidental e da brasileira, desde a origem colonial – com o desejo por formas novas nossas, contrárias ao lugar-comum. E aí se percebe seu pressuposto de ser a língua um “universo de possibilidades”, aposta na força da poesia, no potencial transformador e no sentido ético da literatura, bem como da tradução e da interpretação, abertas à voz do outro. Nesse sentido, destaca-se o olhar de José Paulo Paes para o modernismo brasileiro, valorizado por se aventurar na criação de uma literatura inventiva, enraizada na cultura local. E sobressai também a atenção que ele concedia às gerações novas de poetas e ficcionistas, com o propósito de contribuir para os debates do seu tempo e de reconhecer o valor de bons escritores.
Lançamento do livro José Paulo Paes: Crítica Reunida sobre Literatura Brasileira & Inéditos em Livros com bate-papo entre Fernando Paixão e Ieda Lebensztayn e mediação de Eliane Robert Moraes
14 de setembro,19h
Livraria da Tarde (Rua Cônego Eugênio Leite, 956, Pinheiros, São Paulo – SP)
Preço: R$ 90 (cada um dos volumes)
