A nova utopia, editora Quatro Cantos, 2022, reúne 67 novos poemas de Régis Bonvicino. O livro se alterna entre o gênero poema ele mesmo, prosa poética curta e prosa poética mais longa. É marcado por uma variedade linguística, decorrente de espelhamentos, ou seja, de uma investigação do mundo contemporâneo de miséria e de mendigos, de decadência e desesperança, aqui e no exterior, Brasil e Europa em cotejos, contrastes e confrontos.
O cenário é a cidade: principalmente São Paulo, mas também Rio de Janeiro, São Luis do Maranhão, Paris, Nice, Roma, Sevilha, não para fins de “diário de viagens” mas para comparações e paralelos críticos.
O livro consiste numa tentativa de interpretação dessas realidades e não em um “discurso” sobre elas: os poemas são minuciosamente construídos. Escrita seca, mas sensível, articulando arte e cultura no cotidiano duro das pessoas na contramão dos sentimentalismos etéreos. Por isso também se caracteriza como um livro em branco e preto, que trabalha com personagens em nível de sobrevivência: fascismos, guerras, imigrantes, indiferença, fome, atentados etc. Nesse aspecto, pode-se dizer que, de algum modo, se relaciona com o neorrealismo italiano sobretudo o de Pier Paolo Pasolini e Roberto Rosselini. A nova utopia, ao penetrar na realidade das ruas e de seus conflitos, representa tentativa de buscar uma explicação para o caos e referida barbárie contemporânea. É um livro reflexivo e, por isso, não há nele poemas edificantes ou lugares de repouso. Seu tema mais central é o espaço público urbano degradado; os mendigos afloram como atores principais que não atuam; nos bastidores, os novos utopistas propõem, ambiguamente, suas ideias.
O crítico cubano Ricardo Alberto Pérez observa que a poesia de Régis Bonvicino representa uma combinação feliz e pouco comum ao fundir a obsessão pela linguagem com a vocação intensa de estar nas ruas.
O crítico uruguaio, residente na Cidade do México, Eduardo Milán, escreve na orelha: “A lucidez poética de Régis Bonvicino se joga inteira quando evita toda nostalgia de outros tempos – tanto poéticos como históricos – para confrontar este presente histórico com o tempo da poesia”.
O poeta e crítico Luis Dolhnikoff assim se expressa: “Porque essa é uma poesia de uma beleza áspera e de uma imagética bruta, além de minuciosa. Disseca a seco a feiura caleidoscópica da cidade-mundo e do mundo urbanizado. E aproxima, afinal, a poesia brasileira contemporânea desse mundo até lhe roçar as chagas”.
O crítico Alcir Pécora afirma no prefácio do libreto Deus devolve o revólver (2019/2020): “A qualidade dessa poesia, por si mesma, é extraordinária – eis o que precisa ser dito antes de mais nada”.
Novo streaming
Deus devolve o revólver (2019/2020), publicado em todas as plataformas de streaming, consiste na primeira parte dos trabalhos sonoros feitos pela parceria Rodrigo Dário e Régis Bonvicino com 16 poemas do então livro em progresso A nova utopia que ora se edita, com 67 poemas, pela editora Quatro Cantos. Também com produção artística e arte sonora de Dário, lança-se, junto com o livro, a segunda parte do projeto com o título igual: A nova utopia (2021/2022). As vozes são da soprano Caroline De Comi e de Régis Bonvicino. O alaúde foi tocado pelo refugiado sírio em São Paulo Rajana Olba. Esse novo streaming combina poemas apenas lidos pelo poeta com outros nos quais se dá a intervenção de Dário. O mesmo Pécora já afirmara: “Algo novo se gestou entre eles: um álbum de poesia eletrônica heavy”. Trata-se de trabalho de palavra falada com intervenções sonoras incomuns, intervenções que compreendem os poemas e com eles criam um terceiro objeto artístico no qual os poemas deixam de ser apenas poemas. E o som deixa de ser apenas som.
Ficha técnica
O álbum A nova utopia foi gravado no Nimbus Studios em São Paulo, em 2021/2022. Poemas de Régis Bonvicino do livro A nova utopia (Quatro Cantos, 2022). Sequência da parceria de Rodrigo Dário e dele, iniciada com Deus devolve o revólver (2019/2020). A captação de som foi feita por Tamires Pistoresi. As vozes são da soprano Caroline De Comi e de Régis Bonvicino. O alaúde foi tocado pelo refugiado sírio em São Paulo Rajana Olba. A masterização foi feita por Alexandre Marino. A produção artística e o projeto do álbum são de Rodrigo Dário. O poema “Lápide” foi lido por Maria, provavelmente moradora de rua, que estava na plateia do evento Deus devolve o revólver no Largo do Poço da Baixa de Coimbra. Maria se entusiasmou e foi ao “palco”. De Lírio Records © 2022
https://editoraquatrocantos.lojaintegrada.com.br/a-nova-utopia