François Luong nasceu em Strasbourg, França, e vive em San Francisco. Traduziu as obras de Esther Tellermann, François Turcot e Rémi Froger, como também de poetas francófonos de Québec e de outros países. Suas traduções estão disponíveis em LIT, West Wind Review, Verse, Dandelion (Canadá), Aufgabe e em outros sites.
Cf.: http://xpoetics.blogspot.com.br/2013/03/francois-luong.html.
A. LEITURA DE POESIA
Sibila: Você lê poesia?
Luong: A poesia, sim, entre outras coisas. Mas os livros de arquitetura, de ciência e de vulgarização científica, sobre a dança, isso também é poesia. E não esqueçamos Sebald. Quanto a isso, gosto muito do termo alemão Dichtung. Eu leio Dichtung.
Sibila: Que poesia você lê?
Luong: Não faço diferenças entre os vários tipos de poesia. Procuro ler todos, desde a poesia tradicional à experimental. Procuro ler, principalmente, a que meus amigos têm a generosidade de me trazer. Recentemente, meu amigo Román Luján fez com que eu descobrisse o poeta mexicano Jorge Fernándes Granados, que adoro.
Sibila: Você acha que a leitura de poesia tem algum efeito?
Luong: Aconteceu-me perder o ponto para descer do ônibus ou do metrô por estar demasiado imerso na leitura de um poema. Quanto ao efeito que a poesia produz nos outros, não saberia dizer muita coisa.
B. ESCRITA DE POESIA
Sibila: O que você espera ao escrever poesia?
Luong: Espero poder construir uma arquitetura que só existe com as palavras e as frases. O leitor não precisa estar incluído.
Sibila: Qual o melhor efeito que você imagina para a prática da poesia?
Luong: É uma questão difícil. Penso que a poesia está sujeita às mudanças tecnológicas, entre as quais a web e as redes sociais. A maioria dos poemas publicados na web ainda funcionam sob o paradigma de uma página com suas margens físicas e em duas dimensões. Quem sabe o que poderá acontecer quando alguém pensar em escrever com todas as possibilidades oferecidas por um vídeo.
Sibila: Você acha que a sua poesia tem interesse público?
Luong: Isso depende realmente daquilo que se entende por “público”. A poesia em si não tem um lugar importante na discussão pública, na França ou nos EUA. Ela tem a imagem de uma arte relativamente obscura e hermética. Também exige mais atenção do que um tweet de 140 caracteres, o que me parece ser o essencial da consumação textual de nossos dias. O público, em geral, requer uma satisfação imediata, coisa que a poesia, tradicionalmente entendida, não fornece. Quanto a isso, pode ser que poetas brasileiros tais como Décio Pignatari estejam adiante dos poetas franceses ou americanos pela maneira como eles questionam os modos de consumação contemporâneos.
C. PUBLICAÇÃO DE POESIA
Sibila: Qual o melhor suporte para a sua poesia?
Luong: Não creio que existam suportes ideais. Cada suporte tem suas restrições e suas possibilidades. A web tem possibilidades que o livro não tem. Idem para as tiras dos quadrinhos.
Sibila: Qual o melhor resultado que você espera da publicação da sua poesia?
Luong: Que outros encontrem um sentido no qual eu não havia pensado ao compor o poema. Sou um pouco tradicional. Sou muito ligado ao significado de uma frase.
Sibila: Qual o melhor leitor de seu livro de poesia?
Luong: Não se trata de uma competição. Não cabe a mim julgar meu leitor.
Sibila: O que você mais gostaria que acontecesse após a publicação da sua poesia?
Luong: Interesso-me muito pela tradução, não apenas de uma língua a outra, mas também de uma forma a outra. Gostaria muito de ver o que um artista poderia fazer com um de meus poemas. Estou pensando, em particular, na obra de Anselm Kiefewr, que se inspirou nos poemas de Paul Celan e de Ingeborg Bachmann.
A. LECTURE DE POÉSIE
Sibila: Lisez vous poésie?
Luong: La poésie, oui, entre autres. Mais les livres d’architecture, de science et de vulgarisation scientifique, sur la danse, ceci aussi, c’est de la poésie. Et n’oublions pas Sebald. En cela, j’aime beaucoup le terme allemand Dichtung. Ich lese Dichtung.
Sibila: Quel genre de poésie?
Luong: Je ne fais pas de différence entre les poésies. J’essaie de tout lire, de la poésie traditionnelle à la poésie expérimentale. J’essaie surtout de lire ce dont mes amis ont la générosité de m’apporter. Récemment, mon ami Román Luján m’a fait découvrir le poète mexicain Jorge Fernández Granados, que j’adore.
Sibila: Pensez vous que la lecture de poésie produit quelque effet?
Luong: Il m’ait arrivé d’avoir manqué un arrêt de bus ou de métro parce que j’étais trop investi dans la lecture d’un poème. Pour l’effet que la lecture de poésie produit sur les autres, je ne saurais pas trop dire.
B. ÉCRITURE DE POÉSIE
Sibila: Qu’est ce que vous attendez en écrivant poésie?
Luong: J’espère pouvoir construire une architecture qui n’existe qu’avec les mots et les phrases. Le lecteur n’a pas besoin d’être inclus.
Sibila: Quel est le meilleur effet que vous imaginez pour la practique de la poésie?
Luong: C’est une question difficile. Je pense que la poésie est sujette aux changements technologiques, entre autres le web et les réseaux sociaux. La plupart des poèmes publiés sur le web fonctionnent encore sous le paradigme d’une page avec des bords physiques et en deux dimensions. Qui sait ce qui pourra arrivé une fois que quelqu’un pensera à écrire avec toutes les possibilités offertes par un écran.
Sibila: Pensez vous que votre poésie pourra avoir un certaine valeur pour le public?Lequel?
Luong: Cela dépend vraiment de ce qu’on entend par « public ». La poésie en elle-même n’a pas une grande place dans la discussion publique en France ou aux États-Unis. Elle a l’image d’un art relativement obscur et hermétique. Elle demande aussi plus d’attention qu’un tweet de 140 caractères, ce qui me semble être l’essentiel de la consommation textuelle de nos jours. Le public général demande une satisfaction immédiate, ce que la poésie telle qu’on l’entend traditionnellement, ne fournit pas. En cela, peut-être que les poètes brésiliens tels que Décio Pignatari ont une longueur d’avance sur les poètes français et américains sur la manière dont ils questionnent les modes de consommation contemporains.
C. PUBLICATION DE POÉSIE
Sibila: Quel est le meilleur support pour votre poésie?
Luong: Je ne pense pas qu’il y ait de support idéal. Chaque support offre ses restrictions et ses possibilités. Le web a des possibilités que le livre n’offre pas. Idem pour la bande dessinée.
Sibila: Quel est le résultat le plus intéressant que vous attendez de la publication de votre poésie?
Luong: Qu’on trouve un sens auquel je n’avais pas pensé lors de l’écriture du poème. Je suis un peu vieux jeu. Je suis très attaché au sens d’une phrase.
Sibila: Quel est le meilleur lecteur de votre livre de poésie?
Luong: Ceci n’est pas une compétition. Ce n’est pas à moi de juger mon lecteur.
Sibila: Quelle est la chose la plus intéressante qui pourrait se produire pour vous après la publication de votre poésie?
Luong: Je m’intéresse beaucoup à la traduction, non seulement d’une langue à une autre, mais aussi d’un format à un autre. J’aimerais voir ce qu’un artiste pourrait faire d’un de mes poèmes. Je pense notamment à l’oeuvre d’Anselm Kiefer qui a été inspirée par les poèmes de Paul Celan et d’Ingeborg Bachmann.
Ou
Para Stacy Doris
1.
Ou esquecer o corpo
e entrar num
outro teatro
onde a sentença
não possa e não deva
terminar.
8 ½ por 11
folhas brancas de papel
O que se move ao longo de
uma linha
ou lá
pelo batente da porta
ou a porta
dando para
2.
Ou entrando nessa sala
moldada em não sala
o arranjo de objetos
(o ronco do
rolamento
aterrissando no
concreto)
(a escada em espiral
ecoando na sala da
galeria cheia de
…)
suas mãos abertas
nessa casa
seu soalho nu
de tacos
o sofá recoberto de linho
Aqui e
3.
Ou a sala de projeção
cor-de-mirtilo
duas mulheres uma
a cantora que não canta
está agora correndo cruzando
ruas à luz do neon
em movimento-lento
laivos de ciano, magenta, púrpura
sua paleta usual.
Agora este cenário contra
le prix auquel
j’ achète
mon bonheur illimité
Ou a biografia do outro como
4.
Ou o microfone de ambiente
grudado nos cabos
do carro e seus trilhos não
como ouvido mecânico
(bigorna, martelo, estribo)
mas como mecanismo de escrita.
A mão recebe.
Especialmente lá… uma certa
frequência… quase agradável
de se ouvir… ruídos…
Sentenças feito sentenças.
As buzinas, sirenes, campainhas
dos carros que passam
feito sentenças
nos combinamos em
algo além
da metáfora visual
5.
Ou alcançar agora
essa arquitetura
da memória: a moldura
de lenho as prateleiras
a janela se abrindo para
o quintal a escada
em espiral na galeria
Maiden Ln & Stockton St.
tudo deixado à vista,
palavras e sentenças deixadas
para recriar
um corpo um rosto
um negativo de um filme
ou
Or
for Stacy Doris
Tradução: Aurora Bernardini
1.
Or forget the body
to come into
another theater
where the sentence
cannot and should not
end.
8 ½ by 11
white pieces of paper
What moves along
a line
or there
for the frame of the door
or the door
opening into
2.
Or entering this room
shaped as not-room
the arrangement of objects
(the rattling of
ball-bearing
landing on
concrete)
(the spiral staircase
echoing in the gallery
room full of
…)
your hands open
into this house
its naked
wooden floor
the linen-covered couch
Here and
3.
Or the projection room
blueberry-colored
two women one
the singer who doesn’t sing
now running across
neon-lit streets
in slow-motion
hues of cyan, magenta, purple
his usual palette.
Now this set against
le prix auquel
j’achète
mon bonheur illimité
Or the other’s biography as
4.
Or the ambient microphone
held close to the cable
-car rails not
as mechanical ear
(anvil, hammer, stirrup)
but as writing device.
The hand receives.
Especially there … a certain
frequency … almost kind
of listening … noises …
Sentences made sentences.
The horns, bells, and sirens
of passing vehicles
made sentences
we arrange into
something beyond
the visual metaphor
5.
Or reach now for
this architecture
of memory: the wooden
frame the shelves
the window opening into
the courtyard the spiral
staircase in the gallery
Maiden Ln. & Stockton St.
all laid into view,
words and sentences left
to recreate
a body a face
a film in negative
or
Lugares contemporâneos da poesia
Concepção do projeto: Alcir Pécora e Régis Bonvicino
Texto introdutório: Alcir Pécora
Realização: Régis Bonvicino, com a colaboração de Aurora Bernardini e Charles Bernstein
Há reiterados momentos do contemporâneo em que a prática da poesia se parece exatamente apenas uma prática, uma empiria, uma rotina. Faz-se poesia porque poesia é feita. Edita-se poesia porque livros de poesia são editados e foram editados. Por que não continuar editando-os?
Mas qual o significado da arte, quando a arte se reduz a empiria, procedimento habitual que não problematiza os seus meios? Que deixa de inventar os seus próprios fins? Que não desconfia de sua forma conhecida, nem arrisca um lance contra si, inconformada?
Para tentar saber o que pensam a respeito da poesia que produzem alguns dos mais destacados poetas estrangeiros em ação hoje, a revista Sibila propôs-lhes algumas perguntas simples, primitivas até – silly questions! –, cujo escopo principal é deixar de tomar como naturais ou óbvios os automatismos da prática.
Trata-se de saber dos poetas, da maneira mais direta possível, o que ainda os move a ler, a escrever e a lançar um livro de poesia – ou, mais genericamente, a publicar poesia, seja qual for o suporte.
A condição de, por ora, ouvir apenas os estrangeiros é estratégica aqui. Convém evitar respostas que possam ser neutralizadas a priori por posicionamentos desconfiados de vizinhança.
Leitura de poesia, esforço de poesia e publicação de poesia: nada disso é compulsório, nada disso se explica de antemão. Tudo o que se faz, nesse domínio, é fruto de exigência apenas imaginária. Nada obriga, a não ser a obrigação que se inventa para si. A revista Sibila quer saber que invenção é essa. Ou seja: o que os poetas ainda podem imaginar para a prática que os define como poetas.
Contemporary places for poetry
There are plenty of moments in our current life when the practice of poetry seems exactly a practice, something empirical, a kind of routine. One makes poetry because poetry has been made. One publishes poetry because books of poetry are published and were published, why not going on publishing them?
But what meaning does art have when art is reduced to empiricism, the habitual procedure which doesn’t discuss its means? Which doesn’t any longer make up its own aims? Which is not suspicious of its usual form, nor runs the risk of a move against itself, unresigned?
Trying to know what some of the most distinguished foreign poets in action today think about their own poetry, Sibila proposed some very simple questions, some naïve questions – silly questions! –, whose principal aim is no longer to consider as natural (as obvious) the automatisms of the poetical practice.
Sibila asks the poets to tell in the more direct way what still moves them to read, to write, to publish a book of poetry – or, more generically, to publish poetry, in whatever support.
The choice, for the moment, to listen only to foreign poets’ voice is a strategic one. It’s better to avoid answers which would be neutralized a priori, due to suspicious neighbourly attitudes.
Reading poetry, straining to write poetry, publishing poetry: not at all compulsory, all this, not at all explainable in advance. Everything you do in this domain is the result of mere imaginary exacting. Nothing obliges you, unless the obligation you invent yourself, for yourself. Sibila wants to know what kind of invention is that. Id est: what poets may still make up for the practice which defines them as poets.
* * *
Leia a série completa
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Lugares contemporâneos da poesia
Concepção do projeto: Alcir Pécora e Régis Bonvicino
Texto introdutório: Alcir Pécora
Realização: Régis Bonvicino, com a colaboração de Aurora Bernardini e Charles Bernstein
Há reiterados momentos do contemporâneo em que a prática da poesia se parece exatamente apenas uma prática, uma empiria, uma rotina. Faz-se poesia porque poesia é feita. Edita-se poesia porque livros de poesia são editados e foram editados. Por que não continuar editando-os?
Mas qual o significado da arte, quando a arte se reduz a empiria, procedimento habitual que não problematiza os seus meios? Que deixa de inventar os seus próprios fins? Que não desconfia de sua forma conhecida, nem arrisca um lance contra si, inconformada?
Para tentar saber o que pensam a respeito da poesia que produzem alguns dos mais destacados poetas estrangeiros em ação hoje, a Revista Sibila propôs-lhes algumas perguntas simples, primitivas até – silly questions! –, cujo escopo principal é deixar de tomar como naturais ou óbvios os automatismos da prática.
Trata-se de saber dos poetas, da maneira mais direta possível, o que ainda os move a ler, a escrever e a lançar um livro de poesia – ou, mais genericamente, a publicar poesia, seja qual for o suporte.
A condição de, por ora, ouvir apenas os estrangeiros é estratégica aqui. Convém evitar respostas que possam ser neutralizadas a priori por posicionamentos desconfiados de vizinhança.
Leitura de poesia, esforço de poesia e publicação de poesia: nada disso é compulsório, nada disso se explica de antemão. Tudo o que se faz, nesse domínio, é fruto de exigência apenas imaginária. Nada obriga, a não ser a obrigação que se inventa para si.
A revista Sibila quer saber que invenção é essa. Ou seja: o que os poetas ainda podem imaginar para a prática que os define como poetas.
Contemporary places for poetry
There are plenty of moments in our current life when the practice of poetry seems exactly a practice, something empirical, a kind of routine. One makes poetry because poetry has been made. One publishes poetry because books of poetry are published and were published, why not going on publishing them?
But what meaning does art have when art is reduced to empiricism, the habitual procedure which doesn’t discuss its means? Which doesn’t any longer make up its own aims? Which is not suspicious of its usual form, nor runs the risk of a move against itself, unresigned?
Trying to know what some of the most distinguished foreign poets in action today think about their own poetry, Sibila proposed some very simple questions, some naïve questions – silly questions! –, whose principal aim is no longer to consider as natural ( as obvious) the automatisms of the poetical practice.
Sibila asks the poets to tell in the more direct way what still moves them to read, to write, to publish a book of poetry – or, more generically, to publish poetry, in whatever support.
The choice, for the moment, to listen only to foreign poets’ voice is a strategic one. It’s better to avoid answers which would be neutralized a priori, due to suspicious neighbourly attitudes.
Reading poetry, straining to write poetry, publishing poetry: not at all compulsory, all this, not at all explainable in advance. Everything you do in this domain is the result of mere imaginary exacting. Nothing obliges you, unless the obligation you invent yourself, for yourself. Sibila wants to know what kind of invention is that. Id est: what poets may still make up for the practice which defines them as poets.