MICHEL DEGUY (Paris, 1930), além de filósofo, é um dos mais importantes poetas franceses contemporâneos. Publicou, entre outros, Les Meurtrières (1959), Poèmes de la Presqu’île (1961), Ouï dire (1966), Poèmes 1960-1970, Abréviations usuelles (1977), La Machine matrimoniale ou Marivaux (1982), Choses de la poésie et affaire culturelle (1986), L’Énergie du désespoir, ou d’une poétique continuée par tous les moyens (1998). Fez parte dos grupos das revistas Poésie (que edita desde 1977 e à qual recentemente se associou uma publicação eletrônica com conteúdo próprio, Pour Po&sie), Critique e Les Temps Modernes. É ganhador de dois dos mais importantes prêmios literários franceses, o Grand Prixnational de la poésie e o Grand Prix de Poésie de l’Académie Française. No Brasil, ele publicou, entre outros títulos, A Rosa das línguas (2004) e Reabertura após obras (Editora da Unicamp, 2011), ambos com tradução do poeta e professor Marcos Siscar e da poeta e professora Paula Glenadel. Deguy afirma, em várias entrevistas, que a poesia não está mais – há muito – no centro do debate e da cultura: “O debate oficial determina que seu lugar, o do “simpático”, deve ser o bastante para ela” e, no entanto, para ele, a tarefa do poeta de modo geral deve ser a de: “recolocá-la exatamente no centro do debate cultural”.
Leitura de poesia
Sibila: Você lê poesia?
Deguy: Muito. Eu leio principalmente filosofia, poesia, ensaística, os jornais, os periódicos e – de bom grado – a revista Po&sie, que eu dirijo.
Sibila: Que poesia você lê?
Deguy: De todos os gêneros e espécies; principalmente em francês (tradução) e frequentemente em edição bilíngue.
Sibila: Você acha que a leitura de poesia tem algum efeito?
Deguy: Muito pouco, muito raramente, mesmo que a doxa cultural predominante pretenda o contrário.
Escrita de poesia
Sibila: O que você espera ao escrever poesia?
Deguy: [Espero] ser publicado; ser lido por alguns (oligoï); provocar em alguns a admiração (surpresa) que leva a reler.
Sibila: Qual o melhor efeito que você imagina para a prática da poesia?
Deguy: Um pouco de imitação. O gosto de pensar (n)aquilo que o poema pode “fazer”.
Sibila: Você acha que a sua poesia tem interesse público?
Deguy: Ela poderia pretender isso, quando é boa. Mas a depreciação (… o esquecimento?), que cresce com a idade do autor, diminui essa chance – uma vez que o neo leva tudo.
Publicação de poesia
Sibila: Qual o melhor suporte para a sua poesia?
Deguy: As revistas, os livros, o site da internet, a citação.
Sibila: Qual o melhor resultado que você espera da publicação da sua poesia?
Deguy: Um certo interesse. A polêmica. A predileção de alguns pelo interesse da época (o que abarca muitas gerações, sem confundir isso com o espírito do tempo).
Sibila: Qual o melhor leitor de seu livro de poesia?
Deguy: Chama-se Martin Rueff. Publicou pela Hermann (2009) uma obra muito minuciosa intitulada DifférenceetIdentité – MichelDeguy, situação de um poeta lírico no apogeu do capitalismo cultural.
Sibila: O que você mais gostaria que acontecesse após a publicação da sua poesia?
Deguy: Gostaria que houvesse aprovação, comentário, controvérsia, certa influência de um lado e do outro e junto aos não poetas (filósofos, escritores); e o prazer de continuar.
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Forma
“Oh que minha quilha estoure Oh que eu vá ao mar […]”
É um poema que nos diz isso, poema que retoma o tópos da navegação poética, do elogio do navegante, da fragilidade do poema-esquife. Ora, o barco, por ser ébrio, não pode vazar de todo lado; deve manter-se distinto do elemento que enfrenta, percorre, inventa; manter-se coeso para enfrentar, segundo sua lei, os caminhos do estranho. E, na ocorrência rimbaudiana em que o desejo de explosão não destrói a armação do poema, este permanece unido em lâminas paralelas, em blocos de quadras de dodecassílabos…
Tradução: Aurora Bernardini
Forme
« Oh que ma quille éclate Oh que j’aille à la mer […] »
C’est un poème qui nous le dit, poème qui reprend le topos de la navigation poétique, de l’éloge du nautonnier, de la fragilité de l’esquif poème. Or le bateau, pour être ivre, doit ne pas faire eau de toute part ; doit demeurer distinct de l’élément qu’il affronte, parcourt, invente : demeurer bien assemblé, pour affronter selon sa loi le parcours dans l’étrange. Et en l’occurrence rimbaldienne dont le voeu d’éclatement ne détruit pas la membrure du poème, celui-ci demeurait ajointé en lames bien parallèles, en lisses de quatrains dodécasyllabiques…
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Lecture de poésie
Sibila: Lisez vous poésie?
Deguy: Beaucoup. Je lis principalement: la philosophie; la poésie; les essais; les journaux; les périodiques – et volontiers Po&sie, qui intitule la revue que je dirige.
Sibila: Quel genre de poésie?
Deguy: De tous genres et de toutes espèces; surtout en langue française (traduction) et souvent en bilingue.
Sibila: Pensez vous que la lecture de poésie produit quelque effet?
Deguy: Très peu; très rarement, même si la doxa culturelle, prédominante, prétend le contraire.
Écriture de poésie
Sibila: O que você espera ao escrever poesia?
Deguy: [J’attends] d’être publié; d’être lu par quelques-uns (oligoï); de provoquer, chez un petit nombre, de l’admiration (étonnement) qui incite à relire.
Sibila: Qual o melhor efeito que você imagina para a prática da poesia?
Deguy: Un peu d’imitation. Le goût de penser (à) ce que peut “faire” le poème.
Sibila: Você acha que a sua poesia tem interesse público?
Deguy: Elle pourrait y prétendre, quand elle est bonne. Mais la dévaluation (… l’oubli?) croissant avec l’âge de l’auteur diminue cette chance – puisque le néo emporte tout.
Publication de poésie
Sibila: Quel est le meilleur support pour poésie?
Deguy: Les revues; les livres; le site internet; la citation.
Sibila: Quel est le résultat le plus intéressant que vous attendez de la publication de poésie?
Deguy: Un certain intérêt. De la polémique. La prédilection de quelques-uns dans l’intérêt de l’époque (ce qui embrasse plusieurs générations, sans se confondre avec l’air du temps).
Sibila: Quel est le meilleur lecteur de votre livres de poésie?
Deguy: Il s’appelle Martin Rueff. A publié chez Hermann (2009) un très minutieux ouvrage, intitulé DifférenceetIdentité – MichelDeguy, situation d’un poète lyrique à l’apogée du capitalisme culturel.
Sibila: Quelle est la chose la plus intéressante qui pourrait se produire pour vous après la publication de poésie?
Deguy: De l’approbation; du commentaire; de la controverse; de l’influence ça et là, et chez les non poètes (philosophes; écrivains); le goût de continuer.
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Lugares contemporâneos da poesia
Concepção do projeto: Alcir Pécora e Régis Bonvicino
Texto introdutório: Alcir Pécora
Realização: Régis Bonvicino, com a colaboração de Aurora Bernardini e Charles Bernstein
Há reiterados momentos do contemporâneo em que a prática da poesia se parece exatamente apenas uma prática, uma empiria, uma rotina. Faz-se poesia porque poesia é feita. Edita-se poesia porque livros de poesia são editados e foram editados. Por que não continuar editando-os?
Mas qual o significado da arte, quando a arte se reduz a empiria, procedimento habitual que não problematiza os seus meios? Que deixa de inventar os seus próprios fins? Que não desconfia de sua forma conhecida, nem arrisca um lance contra si, inconformada?
Para tentar saber o que pensam a respeito da poesia que produzem alguns dos mais destacados poetas estrangeiros em ação hoje, a Revista Sibila propôs-lhes algumas perguntas simples, primitivas até – silly questions! –, cujo escopo principal é deixar de tomar como naturais ou óbvios os automatismos da prática.
Trata-se de saber dos poetas, da maneira mais direta possível, o que ainda os move a ler, a escrever e a lançar um livro de poesia – ou, mais genericamente, a publicar poesia, seja qual for o suporte.
A condição de, por ora, ouvir apenas os estrangeiros é estratégica aqui. Convém evitar respostas que possam ser neutralizadas a priori por posicionamentos desconfiados de vizinhança.
Leitura de poesia, esforço de poesia e publicação de poesia: nada disso é compulsório, nada disso se explica de antemão. Tudo o que se faz, nesse domínio, é fruto de exigência apenas imaginária. Nada obriga, a não ser a obrigação que se inventa para si.
A revista Sibila quer saber que invenção é essa. Ou seja: o que os poetas ainda podem imaginar para a prática que os define como poetas.
Contemporary places for poetry
There are plenty of moments in our current life when the practice of poetry seems exactly a practice, something empirical, a kind of routine. One makes poetry because poetry has been made. One publishes poetry because books of poetry are published and were published, why not going on publishing them?
But what meaning does art have when art is reduced to empiricism, the habitual procedure which doesn’t discuss its means? Which doesn’t any longer make up its own aims? Which is not suspicious of its usual form, nor runs the risk of a move against itself, unresigned?
Trying to know what some of the most distinguished foreign poets in action today think about their own poetry, Sibila proposed some very simple questions, some naïve questions – silly questions! –, whose principal aim is no longer to consider as natural ( as obvious) the automatisms of the poetical practice.
Sibila asks the poets to tell in the more direct way what still moves them to read, to write, to publish a book of poetry – or, more generically, to publish poetry, in whatever support.
The choice, for the moment, to listen only to foreign poets’ voice is a strategic one. It’s better to avoid answers which would be neutralized a priori, due to suspicious neighbourly attitudes.
Reading poetry, straining to write poetry, publishing poetry: not at all compulsory, all this, not at all explainable in advance. Everything you do in this domain is the result of mere imaginary exacting. Nothing obliges you, unless the obligation you invent yourself, for yourself. Sibila wants to know what kind of invention is that. Id est: what poets may still make up for the practice which defines them as poets.